Babalorixá explica o significado das cores e roupas do Candomblé

No começo do século XVI o primeiro grupo de escravos chegou ao Brasil, vindos do Golfo de Guiné. Os negros trazidos para o país eram de diversas regiões e em diferentes épocas. Ao serem retirados a força de suas tribos, os africanos buscavam algum modo de manter as suas raízes e tradições. Para a historiadora Gisele Crossard foi por meio das crenças e rituais africanos que eles conseguiram manter parte de sua cultura.
Uma das maiores características que ficou dessa vinda dos negros ao Brasil, eram os cultos afros com suas roupas, geralmente coloridas. As cores básicas do Candomblé são: preto, vermelho e branco. “O preto representa o silêncio e a resignação; o vermelho a energia e a vida; o branco o luto ‘pela morte’ que proporciona o renascimento e a continuidade, nada relacionado com paz ou coisas do tipo, como as pessoas pensam”, explica o babalorixá (Pai de Santo) da casa Ilê Asé Obatorun, Ricardo Ruivo.
Mas na religião afro-brasileira, Candomblé, não são todos os adeptos que podem usar roupas coloridas. “As abyans (novatos no culto, não iniciados) usam somente roupas brancas. As iyawos (adeptos já iniciados na religião) do sexo feminino podem usar roupas coloridas, mas a camisa é sempre branca”, explica o babalorixá.
Ricardo fala também que há cores que não podem ser usadas por quem faz parte da religião. “Por força de Èwó (proibição ou interdito) vários Odus (padrões de energia) são incompatíveis com algumas cores. O uso de tais cores pelas pessoas, por força do Odu que determina a incompatibilidade, acarreta distonias de energia e a manifestação de problemas psíco-físico-emocionais em face de vibrações antagônicas de tais cores” explica.

Uma das maiores características que ficou dessa vinda dos negros ao Brasil foram os cultos afros com suas roupas, geralmente coloridas
O Pai de Santo Ricardo explica que o branco diferencia os orixás funfum, isto é, Oxalá e outros que não podem usar cor nenhuma. Os demais Orixás que usam cores podem também vestir-se de branco, e inclusive devem mesmo vestir a cor às sextas-feiras, e nas festas de Oxalá. “Os Orixás que usam cores claras, não podem, de modo algum, usar cores fortes. Entretanto, os Orixás que usam cores fortes, podem, se quiserem, vestir-se com cores claras”, explica Ricardo.
Uma das adeptas a religião conta que não pode usar a cor vermelha e preta, por interdito de seu Orixá, Oxalá. “Teve um dia que eu ganhei uma blusa preta e vesti para sair. Depois de um tempo eu comecei a ficar muito tonta, sentir muita dor de cabeça e sensação de pressão baixa. Voltei para casa e troquei de roupa, e por incrível que pareça, cerca de dez minutos depois, comecei a me sentir melhor”, diz Carmen*.
O Pai de Santo conta também que antigamente no Candomblé dos anos 50, 60 e até 70, uma pessoa que chegava à porta de um terreiro vestida de preto, era sempre censurada por aquela comunidade, e pedia-se para a pessoa se retirar. “Usar preto em um funeral era desejar que aquela alma não tenha paz pela eternidade, por isso a roupa de luto no Candomblé é o branco”, comenta Ricardo.
A Ekedi (Mulher iniciada que não entra em transe) da casa, Aline de Araújo explica que as roupas do Candomblé só são usadas dentro do terreiro, mas que tem gente que as usa no seu dia-a-dia também. “Tem gente de outras casas que usam as roupas da religião como roupas do seu cotidiano”, comenta.
Os Orixás
No Brasil são cultuadas cerca de 16 Orixás, entre eles estão: Oxalá, Iemanjá, Xangô, Iansã e Ogun. Ricardo Ruivo comenta que o significado das roupas de cada Orixá é relacionado com a sua história (cada Orixá tem um mito a seu respeito) e seus elementos atributivos. “O traje dos Orixás comporta uma multiplicidade de elementos: abadá (blusa), xocotô (calças), ojá (pano na cabeça), saias, filá (estilo de chapéu), turbantes, adê, conta.

O traje dos Orixás comporta uma multiplicidade de elementos: abadá (blusa), xocotô (calças), ojá (pano na cabeça), saias, filá (estilo de chapéu), turbantes, adê
Um dos filhos de santo do Ilê, Carlos*, explica que as divindades além das roupas usam paramentos, que são objetos específicos de cada Orixá, por exemplo Ogun que usa uma espada, um escudo e um capacete, pois é um Orixá guerreiro. “Geralmente, nós fazemos nossos primeiros paramentos de tecido e só depois de três anos de iniciados que podemos usar objetos de metal”, conta o iaô Carlos*
*Nome Fictício. As pessoas não quiseram que aparecesse o nome delas.





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