“Dating burnout”: geração Z está cansada de apps de namoro?
Tinder perde 1,7 milhão de usuários e Bumble despencou 30% na bolsa em 2024.
Postado em 31/03/2025
Com 21 anos, Júlia de Mesquita, universitária, decidiu desinstalar os aplicativos de relacionamento após mais uma experiência desagradável. Igual a ela, outros milhares de jovens estão fazendo o mesmo, o que revela uma tendência entre as pessoas da Geração Z.
Uma pesquisa feita pelo app de namoro Bumble, no final de 2024, mostrou que 3 em cada 4 americanos entre 18 e 25 anos já passaram por algum tipo de esgotamento com a ferramenta. “Sempre achei bastante cansativo e me passava a sensação de que eu já conhecia todas as pessoas que apareciam”, relembra a universitária.

Assim, o “dating burnout” surge como um nome para esse fenômeno que atinge especialmente essa faixa etária – responsável por 35% dos usuários dessas plataformas no Brasil em 2024, segundo a empresa de análise de dados Statista.
A psicanalista Simony Correia, especialista em relacionamentos, explica que os aplicativos de namoro criam um ambiente em que os usuários priorizam aspectos superficiais, idealizando padrões de aceitação quase inatingíveis. “Corpos são tratados como máquinas em prateleira, sem levar em conta as pluralidades humanas. Isso gera uma cultura de fácil descarte, baseada em estruturas machistas e patriarcais”, afirma.
O paradoxo da solidão digital
Correia ainda chama atenção para outro aspecto preocupante: “Embora os aplicativos de namoro possam ser uma resposta ao desejo de conexão, muitos usuários recorrem a essas plataformas justamente por se sentirem sozinhos. Isso cria um ciclo vicioso: a solidão leva à busca por validação digital, que por sua vez gera mais solidão quando as interações não se aprofundam.”

E Júlia confirma – “Depois de um tempo, todas as conversas pareciam iguais. Era sempre ‘Oi, tudo bem?’, fotos de viagem e perguntas genéricas. Não tinha mais graça. Cheguei a me sentir mais sozinha usando os apps do que antes de começar.”
Diante desse cenário, muitos jovens estão buscando alternativas fora do mundo digital. Eventos presenciais, como encontros temáticos e festas voltadas para esse público, têm ganhado popularidade. “Percebi que conhecer pessoas pessoalmente, mesmo que fosse mais difícil, trazia conexões mais reais”, conta Rafael Amaral, 23 anos, que também abandonou os apps.
Além disso, grupos em redes sociais focados em hobbies específicos – como música, esportes ou cinema – estão se tornando espaços para formar amizades e até relacionamentos, sem a pressão dos algoritmos de namoro.

Victor Nascimento, 21 anos, também reforça essa percepção negativa da paquera digital. “A falta de profundidade e a troca física ausente fazem tudo parecer robotizado. As interações seguem um roteiro pré-definido: mensagens curtas, fotos filtradas e expectativas superficiais”, explica.
Para ele, a padronização das conversas foi decisiva para abandonar as plataformas. “Todas as experiências se tornaram homogêneas. Não importa quantos perfis você veja, parece que está falando com variações do mesmo algoritmo”.
Futuro: entre o digital e o real
Especialistas acreditam que, embora os aplicativos de relacionamento não desapareçam, a forma como são usados deve mudar. Simony ressalta que “as pessoas estão mais conscientes dos limites dessas plataformas e buscando equilíbrio entre o digital e o presencial. Like não é afeto, seguir de volta não é amizade e rede social não é a vida real”.
Para Júlia, a decisão de sair dos apps foi libertadora. “Aprendi que conexão não é sobre quantidade, mas sobre qualidade. Hoje, prefiro investir meu tempo em quem realmente importa.”
Enquanto isso, a indústria do namoro digital terá que se adaptar – ou arriscar perder ainda mais usuários para a busca por algo que os algoritmos ainda não conseguem oferecer: autenticidade.