Cannabis medicinal: a luta de séculos

O uso da planta para fins medicinais data muito antes de Cristo e com o avanço das pesquisas pacientes podem cultivar a planta e produzir o próprio remédio

Bruna Teixeira Ricco

Postado em 11/05/2022

Em abril, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o 15º produto de maconha medicinal. Desta vez, trata-se do Canabidiol Active Pharmaceutical. A planta já tem eficácia comprovada no tratamento de algumas doenças, raras inclusive. A luta pela liberação dos medicamentos no Brasil começou em 2014, com a família Fischer.

Em 1995, a Califórnia (EUA) aprovou a “Lei da Compaixão”, que deu origem à primeira regulamentação para a Cannabis medicinal em décadas. / Foto: Pexels.

A história do uso da planta para fins medicinais já é antiga. O primeiro registro data 2.700 antes de Cristo; no ano 70 havia referência no livro “De Matéria Médica”, escrito por Pedânio Dioscórides, considerado o fundador da farmacopéia; em 1843, um artigo sobre as aplicações terapêuticas da Cannabis indica foi publicado e a partir do século 19 o uso medicinal da maconha é difundido pela Europa e Américas; no Brasil, inclusive.

Hoje, são numerosos os estudos a favor do uso medicinal da planta. A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que o canabidiol (CBD), um derivado da erva, não seja tratado como uma droga. E uma pesquisa realizada pela agência Hello Research mostra que 59% dos 1.200 brasileiros entrevistados não têm problema algum com o assunto, inclusive quanto à liberação do tetrahidrocanabinol (THC) – substância psicoativa presente na planta e responsável pela sensação de euforia – para fins medicinais.

A assistente social Tatyane de Camargo conta que teve autorização da Anvisa para usar o óleo importado em 2018 para o tratamento da síndrome do filho. “O importado não controlou as crises, então tive acesso ao óleo integral, que foi mais benéfico para ele.” Ricardo Augusto, filho de Tatyane, tem epilepsia refratária – quando o tratamento com medicamentos não controla as convulsões – e chegava a ter entre 30 e 40 crises epilépticas num único dia, atingindo a marca de mais de 100 certa vez.

A doença em questão é a Síndrome de Sotos, que acarreta atrasos neurológicos, psicológicos e motores. A lista de doenças que podem ser tratadas com o CBD apresenta mais de 32 patologias, com Alzheimer, ansiedade, epilepsia e paralisia supranuclear progressiva.

O filho, que já fazia uso de outros medicamentos há sete anos, começou o tratamento com o óleo de cannabis full spectrum há dois anos e meio. O óleo desse gênero contém todos os tipos de canabinoides e compostos (sendo rico em THC na forma ácida). “A evolução tem sido maravilhosa. Todos que o conheceram antes da cannabis perceberam o avanço neurológico e motor.” Hoje, Ricardo não tem mais crises durante o dia, não se machuca mais, tem mais autonomia e toda a família tem mais qualidade de vida. 

“O habbeas corpus nos dá a tranquilidade de produzir o óleo com todo cuidado e qualidade que é necessário. Hoje ele toma o óleo que nós fazemos para ele.” / Foto: Arquivo pessoal.

Tatyane explica também que a sugestão do medicamento à base de maconha medicinal veio dela e não do médico. Ela foi atrás de estudos e pesquisas a respeito dos benefícios relacionados à epilepsia, não se importando com o julgamento que algumas pessoas tiveram, seja por ignorância ou desconhecimento. Em 2019 eles tiveram autorização da justiça federal para cultivar e extrair o óleo para o filho.