Projeto de Lei propõe programas de estágio especiais voltados a pessoas com autismo

O PL 5813/23 propõe treinamento profissional de pessoas no espectro autista com comprometimento cognitivo nível 2

Julia Torrecillas

Postado em 19/03/2024

O cordão de girassol é um acessório utilizado como símbolo de conscientização e apoio a pessoas autistas e com deficiências ocultas. (Reprodução/Canva)

Está em análise na Câmara dos Deputados a proposta do Projeto de Lei 5813/23, que propõe normas específicas para contratos de estágio destinados à capacitação de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Elaborado pela deputada Iza Arruda (MDB-PE), o texto caracteriza o estágio especial de aprendizagem como o ato de formação e treinamento profissional de pessoas no espectro autista com comprometimento cognitivo nível 2.

O TEA é caracterizado pela alteração das funções do neurodesenvolvimento do indivíduo, que pode interferir na capacidade de comunicação, linguagem, interação social e comportamento. O estudo “Retratos do Autismo no Brasil em 2023” estima que existam cerca de 6 milhões de pessoas autistas no Brasil. No levantamento, cerca de 50% dos respondentes afirmam não ter acesso a recursos e suportes adequados para as suas necessidades autistas. 

Atualmente, existem cotas para pessoas com deficiência no mercado de trabalho, mas muitas das vagas disponíveis não atendem adequadamente às necessidades de pessoas autistas. Para a advogada Larissa Argenta, presidente da Comissão dos Direitos do Autista da OAB, o PL 5813/23 é uma iniciativa que busca o cumprimento dessas cotas. 

A advogada, que é diagnosticada com TEA, também levanta considerações importantes em relação à proposta. “É importante repensar questões como a ausência de vínculo empregatício e as diretrizes relacionadas à carga horária e benefícios. A garantia de uma remuneração adequada para os autistas, assegurando seus direitos plenos no mercado de trabalho, é fundamental para promover uma inclusão efetiva no ambiente profissional.”

Confira outras leis regulamentadas no Brasil que garantem o direito de pessoas com TEA – Crédito: Julia Torrecillas

Desafios e Oportunidades

Nataly Padilha, pós-graduanda em neuropsicologia clínica comportamental, aponta mudanças constantes na rotina de trabalho e comunicação não-assertiva dos supervisores na hora de atribuir demandas como as principais dificuldades encontradas por pessoas com TEA no âmbito profissional. “Existe ainda uma vulnerabilidade para demissões, com a possibilidade do profissional não se adaptar ao ambiente de trabalho ou ser demitido por falta de compreensão dos chefes e colegas de trabalho”, destaca a psicóloga.

Ana Karoline é estagiária de Social Media em uma agência de comunicação. Aos 19 anos, recebeu o diagnóstico de TEA. – Crédito: Arquivo Pessoal

A estudante de jornalismo Ana Karoline Freitas compartilha sua jornada: “Quando recebi meu diagnóstico, estava estagiando na parte de comunicação social de uma empresa. Tive uma conversa com meus chefes sobre ritmo de trabalho, quantidade de demandas e clareza nas explicações. Fizemos um cronograma da minha semana, especificando as demandas por dia, e as datas de entrega de cada uma. Essa organização foi fundamental para eu me desenvolver profissionalmente e desenvolver autonomia e domínio do meu trabalho”, conta.

Para a estudante, é preciso chegar a um meio-termo que atenda tanto às necessidades da empresa, quanto às necessidades específicas de cada pessoa autista. “Eu acho fundamental existir uma lei específica para estágios de pessoas com TEA que exija profissionais dispostos a respeitar todas essas questões. Espero que seja mais fácil para pessoas assim como eu encontrar um estágio, e mais ainda, conseguir usufruir de seus benefícios financeiros e de aprendizado, o que para mim é a parte principal”, finaliza Ana Karoline.