Alunos de altas habilidades participam de projetos literários

Em parceria com biblioteca, sala de recursos em Santa Maria incentiva a leitura e a escrita entre alunos com superdotação em linguagens

Isabella Luciano

Postado em 06/05/2024

A Sala de Recursos de Altas Habilidades e Superdotação de Linguagens (AH/SD) de Santa Maria desenvolve projetos voltados ao incentivo da leitura. São debates sobre livros que ajudam a despertar nos alunos o interesse por clássicos brasileiros. No momento, há  parceria tanto com a biblioteca pública vizinha, a Monteiro Lobato, quanto com a biblioteca interna da escola CAIC, onde a sala de recurso está situada.

O principal organizador e idealizador das iniciativas é Rodrigo Santana, professor da sala de linguagens desde 2018. Amante da literatura, ele desenvolveu ao longo desses anos projetos de estímulo literário e criativo. Desde a pandemia, foram consolidados dois principais, o Super Periferia Literária e o clube de leitura Só Mais uma Página.

O projeto Super Periferia Literária foi pensado para suprir a carência de livros, proporcionar uma maior diversidade de obras e ampliar o interesse pela leitura. A sala atende estudantes do sexto ano do ensino fundamental ao terceiro ano do ensino médio. Portanto, há alunos que estão lá há seis anos e já leram tudo o que estava disponível. Como solução, Rodrigo propôs uma parceria com o CAIC e com a Biblioteca Pública de Santa Maria Norte Monteiro Lobato, que passaram a oferecer o acervo aos alunos. 

“É possível sim estudantes da periferia do Distrito Federal lerem livros de qualidade, livros que vão aumentar o seu arcabouço cultural nas produções de redação, de vestibulares, do PAS, do ENEM e de concursos que eles forem realizar,” diz Rodrigo. 

Além de quantidade, também aumentou a diversidade de obras, o que ampliou o interesse por novos materiais, novas histórias a serem descobertas, assim como novas realidades a serem exploradas. Os resultados do projeto já são visíveis pelo aumento de livros lidos através das fichas preenchidas.

Rodrigo também visou a acessibilidade à leitura no desenvolvimento do Super Periferia Literária. Grande parte dos estudantes são do entorno do DF e é sabido que o custo dos livros no país é muito alto. Dessa forma, o acesso aos livros públicos foi bem vindo, sendo adequado à dinâmica e ao alto fluxo que os estudantes com altas habilidades em linguagem precisam. A ideia também serviu aos leitores que estão em época de vestibular, fornecendo materiais e obras dos editais em questão.

Já o Só Mais Uma Página é uma iniciativa de promoção da leitura através de um clube de leitura, que proporciona um debate e uma troca entre os leitores. Segundo o professor, conseguir fazer a leitura e discutir aquele livro com outros leitores dá uma magnitude ao projeto.

“A partir do momento em que você lê, tem alguém que lê o mesmo livro e que está disponível para fazer a discussão, você percebe novas nuances na sua leitura”.

O clube foi planejado e iniciado primeiramente de forma online, com a proposta de se adequar à realidade que a pandemia impôs. O professor utilizou obras disponíveis online e contou com a participação dos autores para o debate, como Hugo Luminato, que ofereceu gratuitamente o ebook “O Rinoceronte Frederico” .

Com o fim da pandemia, Rodrigo procurou novamente a Biblioteca Monteiro Lobato, que garantiu à sala de AH/SD o empréstimo dos livros necessários para a execução do projeto. Com os novos arranjos, o clube de leitura passou a ter uma leitura a cada dois meses, sendo um livro para os estudantes de ensino médio e outro para os do fundamental.

Os livros escolhidos por Rodrigo seguem o critério de tema e relevância, sendo avaliado também qual debate será proposto, de acordo com sua relevância social e acadêmica.

A biblioteca cede o espaço para encontros ocasionais e também ajuda no critério de escolha dos livros. A cada 15 dias, de acordo com a servidora Pollyana Sampaio, ocorre uma visita da turma de altas habilidades para a escolha de novos livros, uma estratégia para que os alunos possam explorar o acervo disponível.

Os impacto dos projetos literários

A Sala de Recurso de AH/SD, assim como o trabalho feito pelo professor Rodrigo, são reconhecidos por duas alunas que tiveram suas vidas transformadas.

Joyce Rodrigues, caloura de relações internacionais do Iesb, é uma dessas alunas. Ela entrou no atendimento durante o começo da pandemia e participou de ambas iniciativas. “Participar de um espaço que nos acolhesse não só pelas nossas características, mas sobre o que era chamativo para nós, foi fundamental para meu autoconceito positivo como pessoa com altas habilidades/superdotação e pela minha curiosidade e criatividade literária.”

A universitária teve a oportunidade de melhorar sua leitura e conhecer novas vertentes criativas. Ela também se apaixonou pela literatura clássica brasileira e pelos temas que permeiam a sociedade enquanto “laboratório crítico social”, um dos objetivos dos projetos. 


Joyce foi uma das alunas que utilizou para o vestibular livros oferecidos. “O primeiro livro que li na sala foi “Pequeno Manual Antirracista”, da Djamila Ribeiro, e o utilizei muito como referência em vestibulares, redações da escola, Enem e mesmo no meu repertório sociocultural próprio.”

Hellen Kirsten Albuquerque também foi uma das beneficiadas pelo projeto. Ela começou a ser atendida na quinta série pela sala de altas habilidades gerais com uma outra professora, onde fez diversos testes para identificação de suas áreas de destaque.

No mesmo ano, a sala promoveu a produção de um material voltado para o que o aluno tivesse interesse e a proposta de Hellen foi a criação de um livro de uma história infantil. No final de 2016, após avaliação do livro pela professora e em articulação com os pais de Hellen, o livro infantil “O Castelo da Bruxa Tata” foi publicado através da Sala de Altas Habilidades e Superdotação. 

Hellen ficou seis anos em sala com o professor Rodrigo.  “Os projetos são muito importantes, talvez eu não saiba dizer sobre os outros, mas pra mim sempre funcionou. Você chegar e sempre ter algo novo, o professor incentivando e explicando como funciona. Além de estar lá disposto a te ajudar, ler os seus textos, a trazer pessoas novas para conhecermos e fazer, às vezes, até encontros mais leves”.

A Sala de Recursos de Santa Maria

A Sala de Altas Habilidades e Superdotação de Santa Maria, em funcionamento desde 2015, oferece um atendimento especializado às necessidades dos alunos com indicação ou diagnóstico de AH/SD da rede pública de ensino do DF. É composto por três salas, uma voltada aos estudantes com altas habilidades em artes plásticas, outra focada em Códigos e Linguagens e a terceira em artes cênicas. Tem caráter psicopedagógico, com o objetivo de suplementar as potencialidades e áreas de interesse, sendo acompanhada pedagogicamente pela Subsecretaria de Educação Inclusiva- SUBIN. 

Segundo Márcia Mendes de Queiroz, coordenadora intermediária da educação especial de Santa Maria, existe uma lista de espera de 30 alunos com indicação para o atendimento. Após a convocação, esses estudantes serão avaliados pelo professor da área indicada. 

A identificação é com base no modelo dos três anéis do Joseph Rinzulli, seguido pela Secretaria de Educação, em que o estudante precisa apresentar habilidade acima da média, envolvimento com a tarefa e criatividade.

De acordo com o professor Rodrigo, seus estudantes com superdotação/altas habilidades em linguagens possuem um perfil voltado à leitura e escrita, sendo que um hábito influencia a outro. 

Segundo Rodrigo, “eles estão todos estudando, devidamente matriculados, frequentes nas escolas e bem motivados. Acho que esse é o perfil dos meus estudantes da sala de linguagem, estudantes que querem e percebem que é através da leitura, escrita e do estudo que eles vão ascender socialmente.”