Entenda mais sobre o transtorno confundido com a bipolaridade

Enquanto o transtorno bipolar tem fases depressivas e eufóricas bem delimitadas, o borderline é mais instável

Giovana Daniela Ribeiro Alves

Postado em 18/04/2022

“Parece que não cabe mais dentro de mim tanto sentimento, a minha escapatória é muitas vezes me machucar”, relata Aline Heringer, de 23 anos, diagnosticada com Transtorno de Personalidade Borderline desde agosto de 2021.

O psiquiatra e psicanalista João Salla descreve que a baixa tolerância à frustração, dificuldade de lidar com o afeto e a instabilidade do humor são características comuns encontradas no paciente borderline.

É frequente a confusão entre o Transtorno de Personalidade Borderline e o Transtorno Afetivo Bipolar. Por mais que sejam distintos, o borderline é um transtorno de personalidade enquanto o bipolar é um transtorno mental. Eles apresentam sintomas parecidos que podem, inicialmente, significar um desafio para o portador, no momento do diagnóstico. Segundo o psiquiatra, é importante usar o tempo e observação como aliados no momento de diagnosticar o paciente.

O doutor João explica que existe uma diferença entre as manifestações clínicas desses transtornos. O bipolar  tem, ora momentos depressivos, ora mais eufóricos, que podem durar bastante tempo, enquanto uma pessoa borderline pode ser instável sem ciclagens de tempo bem marcadas.

Esse transtorno, por ter essa oscilação mais frequente e instável, muitas vezes é estigmatizado como uma pessoa de temperamento difícil e imprevisível.

O borderline, também conhecido como “limítrofe”, é um transtorno adaptativo de personalidade na qual a pessoa tem grande dificuldade nas relações interpessoais, com baixa tolerância à frustração, dificuldades de lidar com afeto e flutuações de humor marcadas por instabilidade.

Para Aline, essas relações são um dos maiores desafios. Ela descreve que é difícil  viver com toda essa intensidade e instabilidade, mas que também é preciso reconhecer que é muito delicado para quem está de fora conseguir compreender o que ela vive. Relata ainda já ter vivido episódios onde pessoas usaram do diagnóstico para, de certa forma, ferir ou criar um cenário colocando-a como louca e uma pessoa difícil de ser amada.

Para Salla, é preciso ser muito cauteloso ao falar sobre a cura para os transtornos de personalidade. “É perigoso pois denota um grupo de doentes e outro de saudáveis dentro de uma sociedade marcada por sofrimento em todos os indivíduos. Acredito que as pessoas identificadas como ‘borderline’ são adaptadas à sua maneira e, como todos nós precisamos de amparo social, familiar e às vezes profissional, elas também”.

O tratamento é um processo que pode contar com a ajuda de medicamentos e assistência médica clínica que auxiliam no alívio dos sintomas, mas, para o psiquiatra, o essencial é que haja o acompanhamento psicoterapêutico.

Para o psiquiatra, o acompanhamento psicoterapêutico é essencial

A psicóloga especialista em saúde mental e pós-graduanda em psicanálise, Ana Dourado, afirma que o primeiro passo após o diagnóstico é criar uma aliança terapêutica com o paciente para, assim, estabelecer o início do trabalho analítico. Para ela, um dos manejos mais importantes é ajudar o paciente a estabelecer um diálogo consigo mesmo, de forma que consiga entender que, por mais que exista uma parte adoecida no conjunto das características psicológicas dele, existe outra ali que está sadia.

Segundo Dourado, não existe uma abordagem terapêutica que vá surtir mais ou menos efeito no processo de tratamento do paciente, uma vez que isso vai da adaptação do mesmo à abordagem oferecida pelo profissional. Ela reforça que o importante é que o indivíduo não desista da terapia e procure a abordagem que mais se identifique.

Após uma internação recente em uma clínica psiquiátrica e o ingresso em um tratamento, Aline relata já ter percebido uma melhora significativa na qualidade de vida. Antes, a falta de conhecimento sobre si e os seus gatilhos resultavam em crises que muitas vezes culminavam em agressões contra si e pensamentos suicidas. O tratamento proporcionou esse autoconhecimento e autocontrole para lidar com as crises e as frustrações cotidianas.