“Nessa carreira, não existe uma linha de chegada”

Natascha Iplinsky consolidou a carreira de bailarina em Brasília, mas afirma que seu sonho sempre foi dançar para a companhia russa em Orlando

Larissa Alves

Postado em 29/10/2021

Natascha Iplinsky é bailarina clássica, 26, formada pelo Ballet Norma Lillia, em Brasília, e pelo National Ballet of Denver, nos Estados Unidos. Ela também estudou na renomada American Academy of Ballet, em Nova Iorque, e realizou cursos em vários outros lugares no Brasil. 

Natascha Iplinsky considera que a arte no Brasil, principalmente a dança, ainda é muito desvalorizada. (Créditos: Arquivo pessoal)

A brasiliense já foi premiada em vários festivais, como o Valentina Koslova International Ballet Competition, em Nova Iorque. Natascha foi professora em várias escolas de Brasília, e chegou a atuar como bailarina profissional em outras companhias anteriormente, como na The London Ballet Company, na Inglaterra. 

Ela se mudou para Londres pouco antes da pandemia se espalhar pelo mundo. A bailarina conta como foi doloroso ver o país entrar em lockdown pouco antes de sua primeira apresentação. Hoje, ela realiza o seu maior sonho: dançar pela Russian Ballet Orlando, nos EUA.

Em entrevista, Natascha compartilha sobre sua carreira e trajetória desde o início quando se apaixonou pela dança clássica, reflete sobre o cenário das artes em Brasília e os motivos pelos quais tantos bailarinos decidem deixar o país, e ainda conta quais serão os seus próximos passos, depois de chegar onde sempre quis estar. Confira:

Como você diria que tudo começou? Quando se apaixonou pela dança e quando decidiu que queria viver e se dedicar a isso? 

Eu sempre amei dançar e sempre sonhei em ser bailarina, desde bem pequena. Mas tive minha primeira aula apenas aos 12 anos, o que não é muito comum no nosso meio. E apesar de eu ter me apaixonado desde a primeira aula, não foi tão fácil continuar. Eu era a mais velha da turma e não sabia nada, era um pouco frustrante. Mas decidi superar essa diferença com muita dedicação e me entreguei completamente a isso. O momento que senti que era isso que eu queria como profissão foi quando pisei pela primeira vez num palco fora do país. Ganhei uma bolsa pra um curso de férias em Nova Iorque e o teatro era deslumbrante. O que eu senti naquele palco foi tão mágico que ali eu percebi que era isso que eu precisava pra minha vida, era essa a profissão que me faria sentir completa, feliz e 100% realizada. 

Como você enxerga o cenário do ballet clássico em Brasília? 

Brasília foi onde eu comecei, me formei e tive muitas experiências importantes para o meu crescimento. Existem bons professores e boas escolas, ou seja, existe potencial. Mas infelizmente, não existem oportunidades quando falamos de dança profissional. Vários bailarinos talentosíssimos se formando, mas não existe nenhuma companhia profissional sequer. Os bailarinos se formam e só existe  duas opções: ou seguem dançando com suas respectivas escolas (na maioria das vezes sem receber um salário, o que os leva a buscar outra profissão em paralelo) ou saem em busca de oportunidades em outras cidades/países.

O próximo passo para Natascha é consolidar sua carreira nos EUA, além de continuar crescendo como artista e como pessoa. (Créditos: Arquivo pessoal)

Por que buscar formações e trabalhos fora do país? As oportunidades são melhores?

Com certeza. O Brasil é um país que forma artistas incríveis e talentosos, mas que não dá espaço para esses artistas se desenvolverem e consolidarem as suas carreiras. A arte no Brasil, principalmente a dança, ainda é muito desvalorizada. Faltam oportunidades dignas de trabalho, os artistas acabam não tendo espaço. É lamentável. 

Você viveu grande parte da pandemia em Londres, quando estava na The London Ballet Company. Como foi essa experiência? 

Eu me mudei pra Londres no começo de 2020 (antes da pandemia) e eu estava amando cada detalhe dessa nova fase. A cidade é incrível, a cultura inglesa é apaixonante, eu amava o clima frio de lá e a Companhia estava me fazendo crescer bastante. Mas infelizmente, uma semana antes do nosso primeiro espetáculo a pandemia já estava fora de controle e o país entrou em lockdown. Foi um momento difícil, mas tenho muito carinho por tudo que vivi lá e sou muito grata por ter tido a chance de ter ingressado nessa Cia, mesmo que por pouco tempo, já que eles só conseguiram retomar o trabalho agora em setembro, quando eu já tinha recebido um novo contrato em outro lugar. Mas, ainda está nos meus planos futuros explorar mais um pouco da Inglaterra, é um lugar muito rico quando falamos de arte e cultura. 

“Foi um momento difícil. Uma semana antes do nosso primeiro espetáculo a pandemia já estava fora de controle e o país entrou em lockdown”, conta Natascha sobre a experiência de ter se mudado para Londres no início de 2020. (Créditos: Arquivo pessoal)

Como tem sido viver nos EUA atualmente? Sente saudades de casa?

Os EUA são  um país incrível. Eu sinto uma ligação forte com esse país, admiro muito a cultura, a infraestrutura e as pessoas que, em sua grande maioria, são super receptivas e amigáveis. Ainda não vim de vez, pois preciso finalizar meu processo imigratório no Brasil, que por conta da pandemia está sendo mais demorado. Mas nesses dois meses que passei aqui em Orlando, posso dizer que estou muito satisfeita e muito animada com essa nova fase. A Cia. tem um trabalho com o qual me identifico bastante e estou aprendendo muito, é uma troca muito rica tanto com os professores e diretores (todos são russos e possuem uma bagagem artística enorme) quanto com os bailarinos, que são muito talentosos. Apesar de não ter vindo para passar muito tempo agora, a saudade de casa é algo constante. Em breve estarei por lá e pretendo aproveitar bastante a minha família e o meu país, já que quando eu vier de vez sei que vai demorar para revê-los e a saudade é algo que nunca passa. 

Como é a sensação de estar dançando para a Orlando’s Russian Ballet Company & School? Esse era o seu maior sonho? Quais os próximos passos para Natascha Iplinsky?

É literalmente o meu sonho mais antigo e mais desejado sendo realizado. Foram muitos anos de trabalho, dedicação, dificuldades e superações. E ter conseguido alcançar esse feito no meio da pandemia me traz uma satisfação ainda maior. Quando pisei no palco pela primeira vez com eles foi algo muito mágico e marcante, foi o momento que eu vi que cada esforço e cada lágrima ao longo da minha jornada valeram a pena. O que eu espero do futuro é continuar crescendo como artista e como pessoa, consolidar minha carreira aqui nos EUA, dançar novos repertórios e novas produções, desafiar meus limites e me tornar a bailarina que sonho em ser. Nessa carreira, não existe uma linha de chegada. É uma jornada infinita e eu quero continuar percorrendo dando o melhor de mim a cada dia.