Quando você tem esperança no jovem, lute por ele, que dá resultado

Com mais de 10 mil seguidores no Instagram, padre consegue cativar os jovens de diversas maneiras. E sem abandonar sua identidade

Bruna Teixeira Ricco

Postado em 09/05/2022

No Instagram, o padre tem um dia específico em que ele abre uma caixinha de perguntas e as respostas são todas através de músicas. / Foto: Padre Angelo.

Ele adora um pagode e se rolar rap nem vai precisar de letra para cantar. Ângelo Henrique Senchuk. Este é o nome do padre que tem feito sucesso entre os jovens. Pai, amigo, padre, cantor, aventureiro… casamenteiro? São algumas das atribuições que podemos dar ao padre, afinal, ele faz jus a todas elas. Também adora citar Jack, o Estripador, e a célebre frase: vamos por partes. E a palavra mais utilizada por ele, sem dúvida alguma, é efetivamente. Tudo isso se junta num combo perfeito que atrai a atenção de seu objeto de trabalho: o jovem.

Quando o senhor teve essa certeza de que era a vida religiosa que você queria seguir? Eu estava fazendo um trabalho de missões com vários jovens como eu, nos meus dezessete anos de idade numa ilha, no litoral paranaense, e era um lugar que estava passando por uma situação difícil de falta de padres, falta de um apoio espiritual e nós jovens fomos pra lá. E dentro desse ambiente nós encontramos o sofrimento das pessoas por falta de alguém que pudesse falar para ela sobre Deus. Então foi nesse ambiente que eu senti que Deus me chamava pra doar minha vida pra ele. Isso não implica que tenha sido fácil. Houve bastante dificuldade, muitos desafios, mas esse foi o momento central do chamado.

E o senhor trabalha com os jovens especificamente. Qual foi a motivação disso? Por que o jovem?

Acho que desde o início eu me senti muito chamado para trabalhar com jovens tendo a necessidade que os jovens tinham de modo muito específico. Eu vejo que há uma preocupação grande pelas crianças e pelos adultos, até mesmo com os adolescentes, mas os jovens é um grupo que fica meio solto, que não existe um interesse, um apoio tão grande pra eles. E até mesmo as pessoas dizem: a juventude de hoje está perdida. Eu não acredito nisso, eu acredito que ela não está perdida então há o desejo de fazer o jovem acreditar nele mesmo, dado que eu tenho essa habilidade para trabalhar com eles.

Qual é a maior dificuldade de trabalhar hoje em dia com os jovens?

Eu acho que é falta de esperança que as pessoas tenham nos jovens e que os próprios jovens tenham em si mesmo. Porque parece que é impossível superar problemas, parece que eu não consigo deixar meus vícios de lado ou que eu sou somente os meus erros. Isso é uma ideia que é muito recorrente entre eles e também há necessidade de aparecer, de aparentar, de ser alguém que você não é, isso gera uma infelicidade muito grande. Então, eu acho que esse são os grandes problemas da juventude hoje, como as pessoas não investem neles, eles ficam abandonados e acabam sendo justamente aquilo que as pessoas dizem que eles são. Eu acho que esse é o grande desafio. 

Um meio muito utilizado pelo senhor é o Instagram né? São mais de dez mil seguidores. De que forma o senhor analisa esse meio?

De uma maneira muito positiva. Eu não posso ficar fechado dentro da igreja esperando que venham até ali, muito pelo contrário, eu também tenho que ir ao encontro deles, eu tenho que estar também nos meios que eles se encontram, mas tendo claro a minha identidade, qual é o meu objetivo, que não é simplesmente ter uma relação com as pessoas numa rede social. O Instagram não substitui relação pessoal, mas é uma porta de entrada, é um ir ao um encontro deles, entrar nesse mundo e fazer com que a mensagem que eu tenho a transmitir chegue até eles, que conheçam o sacerdote que tem esperança neles, que goste deles e que seja acessível a eles. Então acho que é algo importante, é algo necessário e tomara que mais sacerdotes também tenham esse ímpeto de se lançar nas redes sociais, não para promover a própria imagem, mas para transmitir uma mensagem.

Além de padre, o senhor é também diretor espiritual. Fala um pouco sobre isso, o que é, como funciona.

A direção espiritual são conversas que o jovem, ou a pessoa, tem com o sacerdote em que ele vai falar de muitas coisas, como por exemplo esse aspecto mais humano, afetivo, como também intelectual, espiritual. E o objetivo das direções espirituais é oferecer um ambiente seguro de confiança. O padre não pode falar sobre o que aquilo que ele escutou com ninguém, oferece também um local seguro pra pessoa poder conversar, pedir conselho e entender como ela pode crescer diante de Deus, diante das outras pessoas e diante dela mesmo. Essa direção espiritual ajuda você a entender qual é o caminho que você tem que fazer para chegar ao seu crescimento, algo que eu gosto bastante, que eu vejo muito necessário e espero que mais pessoas se abram às direções porque os diretores espirituais fazem uma grande diferença na vida.

Bom, o senhor tem por volta de 60, 70 dirigidos e, desses, apenas 5 ou 6 são mulheres. Por que essa diferença tão grande?

Não é porque as mulheres são complexas. A minha missão hoje aqui na cidade é mais voltada aos homens. Dentro do nosso movimento, existem mulheres consagradas dedicadas à atuação espiritual das meninas. Eu posso me esforçar muito, eu posso estudar muito, mas por eu ser homem, vou entender melhor os homens, assim como uma consagrada vai entender melhor uma menina, o que não impede que eu atenda a menina, de que seja um trabalho incrível e dê um resultado muito bom, mas de modo específico, a minha missão hoje me convida a ajudar mais aos rapazes que as mulheres.

Tendo um contato tão grande com esse jovem você começa a fazer parte da vida de cada um deles. Qual foi o momento mais marcante que o senhor pode viver com eles?

Eu acho que tem vários momentos diferentes. Um momento incrível é você ter acompanhado um jovem e depois você já poder celebrar o casamento dele. Ter acompanhado todo o processo de namoro, de discernimento sobre o pedido de noivado. Poder abençoar as alianças de noivado e depois receber o convite para poder fazer o casamento, porque você viu ele crescer, então é algo muito gratificante, é uma experiência realmente incrível de pai, muito forte.

E o momento mais engraçado que o senhor viveu com eles?

Bom, um dos mais engraçados foi recentemente. Estando em missões, eu estava com perto de um jovem que eu atendo e ele tem uma vida bastante alegre, né? Ele gosta bastante de ir para as festas, gosto bastante de beber e quando a avó dele ligou pra ele pelo celular pra perguntar onde ele estava, ele disse que ele estava nas missões. E ela não conseguiu acreditar nele. Justamente porque ela conhece o neto. E então ele falou “eu vou passar o telefone pro padre que está do meu lado” e passou o telefone pra mim e ela não conseguia acreditar que eu era padre porque ela não conseguia acreditar que o neto dela estava fazendo isso. Eu passei vários minutos tentando convencê-la e ela não acreditando. Depois ela me perguntou se não tinha festa, se não tinha bebida, ela não conseguia entender. Depois ela finalmente aceitou que ele estava em missões e pra mim foi muito engraçado porque nem o familiar dele conseguiu acreditar que ele estava naquele ambiente. Para mim isso é forte porque é justamente aquilo que eu falava antes, quando você tem esperança no jovem, você luta por ele, ele dá resultado, ele muda, ele transforma a vida dele. Ele tem essa capacidade, mas se nós seguirmos não acreditando neles isso não vai acontecer.

O senhor se cuida muito com atividade física. Esse é mais um dos meios de chegar aos jovens ou é uma coisa sua mesmo, ou são os dois juntos?

As duas porque eu acho que é muito importante cuidar da própria saúde. E eu estaria sendo omisso se eu falasse a todos que devem cuidar da sua saúde, mas eu mesmo não cuidasse. Então a atividade física pra mim é um meio de descanso porque também o trabalho de escutar pessoas por muitas horas é bastante desgastante, então é importante pra você estar bem com você mesmo, com a sua saúde, ajuda muito, depois cuidar da da própria saúde, querendo ou não se você não faz nenhum tipo de esporte, nenhuma atividade, a probabilidade de você ficar doente, é muito maior. Então, eu invisto bastante, mas ao mesmo tempo é um meio de poder acompanhar os jovens, porque eles são mais jovens do que eu e vivem num ritmo intenso, principalmente no trabalho com os meninos, é importante a questão esportiva, jogar o futebol, fazer uma corrida, ou seja o esporte que for. Então, é um meio de me aproximar deles.

Uma outra parte que é muito engraçada também de analisar, é a parte da música, né? O senhor é bem eclético e o seu Instagram vai de Mateus Fernandes e Dilsinho a Puff Daddy. Como isso funciona tão bem com os meninos?

O ser humano é muito individual. E a música é uma expressão daquilo que o homem tem em seu coração. Então a riqueza da música é muito grande e eu acho que ela fala muito e pode ajudar muito, né? E tem músicas motivacionais, músicas românticas, músicas que fazem a gente ficar feliz, o que te faz pensar. Então eu gosto de uma variedade grande de músicas por isso. Mas ao mesmo tempo imagina você atender sessenta jovens. Eles não vão escutar só pagode, existe uma variedade grande. É entrar no mundo deles, aprender sobre as músicas que eles estão escutando, ou quase todas. Depois você pode se conectar muito mais através dele, através da música com eles. Quando você entende o que ele está escutando, você entende o que está acontecendo dentro do coração dele. E isso é muito importante. Então eu gosto muito da música pessoalmente e também utilizo ela como meio de me aproximar deles.

Nos últimos tempos dizem que o senhor tem se empenhado muito em algumas listas feitas no seu Instagram. E algumas pessoas até chegam a brincar falando que é um possível Tinder católico. O que tem a dizer sobre isso?

Essa é uma resposta complexa. Como diretor espiritual de jovens eu acho que uma das coisas mais frustrantes, dado que é uma das coisas mais fortes no coração jovem, é o desejo de amar e ser amado, é você vê-lo entrando num relacionamento errado, equivocado. Em que sentido? Pessoas certas que escolhem pessoas erradas. Então, eu me deparei com o fato de que por um lado eu tinha meninos bons e do outro meninas boas que queriam entrar num relacionamento sério, mas que não encontravam essas pessoas. Por que não fazer com que essas pessoas se encontrem? Então entre aspas pode ser chamado Tinder católico. Mas basicamente é oferecer, quando me pedem, uma lista de pessoas que estão querendo entrar num relacionamento, são pessoas boas e que estão dispostas a conhecer novas pessoas. Tem dado certo, tem casais que tem começado assim, que estão indo muito bem, mas a lista não solucionou o problema.

O senhor também é conhecido pelo “soco da unção”. O que é isso?

Quando você entra no mundo dos meninos, entende que a parte física é muito importante. Então, o soco da unção é um soco que eles vão receber do padre quando eles aprontam, quando eles provocam o padre, quando eles fazem uma brincadeira de mau gosto, que muitas vezes já é um meio deles entenderem que aquilo não foi legal. E eles entendem que não devem repetir e acaba gerando uma certa confiança.

Tem algum recordista do “soco da unção”?

Com certeza. Cada encontro a pessoa leva pelo menos uns dois.

O senhor disse que foi escolha sua trabalhar com jovem e o senhor também é muito jovem. No futuro você estará trabalhando ainda com esses mesmos jovens que já estarão adultos, a caminhada vai continuar ou você se vê ainda trabalhando com os nossos jovens?

Eu creio que podem ser as suas coisas porque tanto eu posso acompanhá-los durante o percurso de vida deles como também eu acho que a juventude pode vir no estado do coração. Então pra você trabalhar com jovem não necessariamente você precisa ser jovem, você precisa ter um coração jovem. Dado isso não creio que seja um impedimento continuar trabalhando com jovens pelo resto da minha vida ou até quanto ainda consigo né, acompanhá-los da maneira que eles consigam ser acompanhados. Eu acho que existe uma abertura para as duas coisas e querendo ou não, pelo menos pelos próximos anos manter os jovens próximos de casais jovens, das famílias jovens é algo que também ajuda bastante. Então, possivelmente nos próximos anos ainda trabalharei com essa mesma função.