A missão de manter vivo o legado de Athos Bulcão
Há 29 anos à frente da Fundação Athos Bulcão, Valéria Cabral assume como compromisso pessoal a preservação de um dos maiores patrimônios da cidade
Postado em 11/04/2025
Entre os traços de concreto que desenham o horizonte da capital, há outra assinatura que pulsa viva e elegante: a de Athos Bulcão. Se Brasília é um museu a céu aberto, suas galerias são escolas, hospitais, prédios públicos que recebem mais de 260 obras que convivem com os brasilienses diariamente, como parte da paisagem urbana. Há quase três décadas, Valéria Cabral faz dessas obras sua causa. À frente da Fundação Athos Bulcão, ela cuida de um patrimônio integrado ao cotidiano – e que, justamente por estar tão próximo, corre o risco de se tornar invisível. Na conversa a seguir, a secretária-executiva da FundAthos fala sobre os desafios de preservar um legado que pertence a todos os brasileiros e o que Brasília – cidade que completa 65 anos no próximo 21 de abril – ainda pode fazer para honrar seu artista mais presente.
A FundAthos completa 32 anos dedicados à preservação e divulgação do legado de Athos Bulcão. Você acompanha a instituição desde sua fundação e integra a equipe há 29 anos. Quais os principais fatores que permitiram à FundAthos se manter ativa e relevante por mais de três décadas? Como tem sido sua experiência como uma das poucas mulheres à frente de uma das maiores instituições de arte do país?
Acho que o nome do artista Athos Bulcão e o enorme legado que deixou em Brasília, principalmente, é um dos principais fatores que garantiram e garantem essa longa vida à Fundação. Claro que o trabalho realizado pela equipe da FundAthos tem a maior importância, pois nossa dedicação é fundamental para atravessar os empecilhos e seguir na luta pela missão que escolhemos. É uma penosa luta, mas faço com prazer por acreditar que Athos Bulcão merece todo o reconhecimento possível.
O que te motivou a assumir o cargo de secretária-executiva da Fundação Athos Bulcão? Teve algum momento marcante que definiu sua trajetória na instituição? E a maior realização pessoal nesse tempo à frente da instituição?
Não me deram muito tempo para pensar. Foi um convite surpresa e naquele momento a melhor opção seria eu mesma, então… As realizações são muitas. A vida e obra de Athos Bulcão serem conteúdos obrigatórios no Ensino Fundamental, o tombamento de sua obra pelo GDF, a realização da participação em grandes eventos no Brasil e no exterior, a conquista do espaço onde trabalhamos atualmente, enquanto o prometido terreno não chega.
A Fundação tem um trabalho realmente importante em arte educação que poucas pessoas conhecem, mas há uma geração de atores e jornalistas que foram formados por projetos da instituição. Tem alguma história de alguém impactado pela FundAthos que te marcou nesses 32 anos?
Muitos são os profissionais que ‘saíram’ daqui da Fundação. Uma das meninas que começou aqui aos 16 anos, hoje é doutora, professores que participaram de nossos festivais de teatro são hoje doutores que lecionam em universidades públicas pelo Brasil.
Como é trabalhar diariamente para preservar e divulgar a obra de um artista como Athos Bulcão? Qual é o maior desafio em manter vivo o legado de um patrimônio artístico no Brasil?
Cuidar de patrimônio é sempre complicado, sobretudo quando você é gestor de uma fundação que não possui nenhum tipo de aporte financeiro. O prazer de trabalhar com a obra lúdica, elegante e criativa de Athos Bulcão é o que nos impulsiona e nos faz persistir.
Como o próprio Athos Bulcão via o trabalho da FundAthos? Ele acompanhava de perto? Deixou algum recado ou desejo sobre como gostaria que sua obra fosse cuidada? Você que conviveu de perto com o artista, tem alguma coisa nas obras dele que só quem o conheceu pessoalmente consegue perceber? Algum detalhe ou intenção que você, por ter essa intimidade, acaba cuidando com um carinho especial?
Athos ficou muito feliz com a criação da Fundação. Achava que com a instituição seu legado estaria preservado. Acho que o mais impressionante na obra dele é o uso das cores que ele dizia ter aprendido com Portinari. Ele era de enorme generosidade. Integrava sua arte à arquitetura sem ser maior que a obra do arquiteto. Não gostava de decorar, gostava de integrar.
Quais são os próximos grandes passos da Fundação Athos Bulcão? Qual é o maior objetivo da FundAthos para os próximos 5 anos?
O principal é continuar existindo com a missão que nos propusemos. No momento estamos mais perto de conseguir a concessão de um terreno para construir nossa sede que tem projeto de João Filgueiras Lima, o Lelé, grande parceiro de Athos Bulcão.
O que Brasília poderia fazer melhor para honrar o legado de Athos Bulcão?
Desenvolver o sentimento de pertencimento, educação patrimonial, manutenção das obras públicas, colaborar com a manutenção da instituição.