Casos de assédio no transporte público: ação dos funcionários é essencial para dar suporte às vítimas

Atitudes corretas na hora da denúncia garantem segurança às mulheres

Vitória de Souza Lucena

Postado em 16/04/2025

O assédio no transporte público é uma realidade que muitas mulheres enfrentam diariamente. O ambiente lotado, a falta de segurança e o receio de denunciar são desafios constantes. No entanto, a forma como os funcionários desses sistemas lidam com essas situações pode fazer toda a diferença.

Anna Beatriz Pinheiro foi vítima de assédio no transporte público. “Eu estava no ônibus voltando do trabalho quando percebi que um homem estava se aproximando demais de mim. No início, achei que fosse por causa da lotação, mas depois senti um toque inapropriado. Fiquei paralisada. Eu não sabia como reagir, e quando finalmente consegui me afastar, ele já havia descido do ônibus”, relata.

Ela reforça como a reação das pessoas ao redor impacta a decisão de denunciar. “Acho que as pessoas acabam ficando com medo de escândalos, não querem ser vistas reagindo”, desabafa.

Recentemente, um caso de assédio relatado no perfil da Mídia Ninja no Instagram chamou atenção para essa questão. Uma mulher compartilhou sua experiência em um transporte público em São Paulo, onde, após denunciar a agressão, sentiu-se desamparada. “Ninguém sabia como proceder. Eu fiquei ali, exposta, sem saber se poderia contar com alguém”. Esse depoimento reforça a necessidade de protocolos claros e funcionários capacitados para lidar com esse tipo de situação.

Daniel foi ex-funcionário do setor de transportes e relatou como funciona o procedimento para os funcionários ajudarem as vítimas. “Existem casos em que, após a reclamação de assédio dentro do veículo, o motorista fechou o ônibus, mudou a rota e foi até a delegacia mais próxima com todos os passageiros a bordo”, explicou.

Roberta Luiza, que também trabalhou por 2 anos para uma empresa de ônibus, detalha como os funcionários são treinados para lidar com essas situações. “No treinamento, é indicado que os motoristas e cobradores acalmem a vítima e evitem assustar o assediador para evitar que ele agrave a situação. O objetivo é encaminhar a vítima, o agressor e possíveis testemunhas para a delegacia ou contar com o apoio de uma viatura policial. Também é fundamental que a denúncia seja feita pelo 180”, orienta.

Ela explica que o protocolo seguido pelos funcionários exige que o motorista siga diretamente para a delegacia e comunique a empresa, especificamente o Centro de Controle Operacional (CCO) responsável pelo tráfego.

Sobre o apoio às vítimas, Roberta ressalta: “É necessário que a vítima comunique a quem estiver mais próximo, geralmente o cobrador. Ele deve avisar o motorista de forma discreta para evitar tumulto e, ao mesmo tempo, manter a vítima por perto, oferecendo apoio e servindo como testemunha para que o crime não fique impune”.

Ainda assim, muitas mulheres têm receio de denunciar. “Há um medo grande de retaliação por parte do assediador, do que vão passar na delegacia ou até mesmo do julgamento das pessoas ao redor. Algumas pensam que não terão o devido apoio”, comenta Roberta.

Ela acredita que campanhas de conscientização podem fazer a diferença. “Se mais mulheres souberem dos seus direitos e perceberem que há um sistema de apoio, o receio de denunciar diminuirá e mais casos serão combatidos”, afirma.

Créditos: Vitória Lucena

O delegado da Polícia Civil Anderson Cavichioli, destacou a necessidade de um atendimento humanizado nas delegacias para evitar a revitimização das mulheres. “Na Polícia Civil do Distrito Federal, existe uma grande preocupação com a capacitação dos servidores para garantir que as mulheres sejam acolhidas sem preconceitos e sem julgamentos. O objetivo é registrar os fatos com o máximo de detalhamento e garantir que todas as provas sejam coletadas”, explicou.

Ele reforçou que a Lei de Importunação Sexual surgiu a partir de um caso ocorrido no transporte público, o que evidencia a urgência de medidas preventivas e punitivas mais eficazes. “Esse tipo de crime ocorre porque os agressores se sentem seguros na impunidade. A capacitação dos funcionários pode mudar esse cenário ao garantir um suporte imediato para as vítimas”, afirma.

Cavichioli também destacou que iniciativas como vagões exclusivos para mulheres e campanhas educativas já são um passo importante, mas não suficientes. “As mulheres têm medo de denunciar porque não sabem se serão levadas a sério. Isso precisa mudar”, conclui.

Campanhas de combate e prevenção no DF

Secretaria de Transporte e Mobilidade faz campanha para coibir o crime nos ônibus do DF / Créditos de Arte: Semob

Com o objetivo de enfrentar esse cenário, a Secretaria de Transporte e Mobilidade do Distrito Federal (SEMOB) lançou campanhas importantes, como a “Mulher, não se cale”, que leva informação e apoio direto aos terminais rodoviários e estações do Metrô-DF. A campanha já passou por diversos pontos estratégicos do sistema de transporte e tem como foco encorajar denúncias e divulgar os canais de apoio disponíveis.

Além disso, o Governo do DF implementa ações permanentes de combate à importunação sexual no transporte público, incluindo treinamentos para motoristas e cobradores, além de painéis informativos e parcerias com a Polícia Militar. Segundo a SEMOB, o objetivo é garantir que as mulheres saibam que não estão sozinhas e que o transporte público deve ser um espaço de respeito.