Detecção do Transtorno do Espectro Autista: quanto mais cedo, melhor

Pessoas com sintomas mais leves podem demorar mais para receber o diagnóstico

Ana Estigarraga

Postado em 26/03/2024

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), estima-se que há cerca de 2 milhões de autistas no Brasil. / Reprodução: Unsplash

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição neurológica que afeta a comunicação, a interação social e provoca comportamentos repetitivos. Nos Estados Unidos, dados do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) apontam que 1 em cada 36 crianças de 8 anos foi diagnosticada com TEA em 2020. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), estima-se que há cerca de 2 milhões de autistas no Brasil.

A detecção precoce do TEA é crucial para proporcionar intervenções adequadas e melhorar a qualidade de vida das crianças e suas famílias. Crianças diagnosticadas precocemente têm maior acesso a terapias e intervenções específicas para o autismo, incluindo terapias comportamentais, fonoaudiológicas e apoio educacional. O tratamento iniciado cedo pode melhorar a cognição verbal e as habilidades escolares, reduzindo a necessidade de apoio contínuo.

Por outro lado, pessoas diagnosticadas tardiamente enfrentam desafios significativos. O impacto no desenvolvimento e na convivência social pode ser sentido por anos. A falta de informação e o estigma em relação ao autismo dificultam a inclusão desses indivíduos na sociedade.

Arquivo Pessoal: Jessica Andrade

Jessica Andrade, mãe de um filho com TEA, percebeu sintomas do transtorno desde cedo: “Desde muito bebezinho percebi que ele era diferente. As outras crianças estavam evoluindo muito rápido, enquanto ele sempre estava no cantinho dele, não usando os brinquedos da forma esperada, com uma fala que não evoluía e comportamentos estereotipados.” O diagnóstico veio com 1 ano e 5 meses, após Jessica pesquisar sobre autismo e procurar um neurologista.

Arquivo Pessoal: Nivia Rocha

Nivia Rocha, mãe de gêmeos com TEA, teve as suspeitas iniciais levantadas pela escola. “Na verdade, quando eles foram para a escola, aos cinco anos de idade, a psicóloga da escola me chamou e começou a enviar relatórios para eu procurar um médico. Os meninos não estavam conseguindo acompanhar”, conta Nivia. Ela destaca também a dificuldade de conseguir um neurologista na rede pública e a necessidade de buscar atendimento particular.

Os desafios são constantes, mas Nivia destaca a importância do apoio da família: “Na questão do apoio, a minha família, a parte que entende, que tem conhecimento, eles são muito voltados, atenciosos, procuram estar sempre em volta deles tentando entender. O carinho é grande e às vezes chega até transbordar. É emocionante.”

Ana Clara Alli, atualmente com 22 anos, recebeu o diagnóstico recentemente após fazer uma avaliação neuropsicológica para acessar os serviços do Núcleo de Apoio ao Estudante da faculdade. Inicialmente buscando confirmar o diagnóstico de TDAH, a avaliação também resultou no diagnóstico de Autismo.

Ana enfrenta desafios diários, como interagir com pessoas desconhecidas e lidar com ambientes barulhentos. “Às vezes, é muito difícil ficar em sala de aula; pegar ônibus ou metrô também é complicado para mim.” Ana acredita que, se tivesse sido diagnosticada precocemente, teria uma relação melhor consigo mesma. “Acho que se tivesse feito tratamento desde cedo eu teria melhor compreensão e conhecimento sobre minhas necessidades e sintomas.”

Diagnóstico é complexo e exige equipe multidisciplinar

Reprodução: Unsplash

A psiquiatra Dra. Neusa Agne, da plataforma Adultos no Espectro, destaca a complexidade da avaliação do autismo. “Os sinais do autismo são qualitativos, não é uma dicotomia do faz ou não faz.”. Ela explica que muitas vezes a pessoa realiza essas ações, mas não com a mesma qualidade ou frequência esperada no desenvolvimento típico.

O diagnóstico é transdisciplinar, envolvendo observação, entrevistas, aplicação de instrumentos específicos e uma equipe multidisciplinar. Para adultos diagnosticados tardiamente, especialmente no nível de suporte 1, as estratégias de camuflagem podem gerar sofrimento e hipervigilância.

Neusa Agne ressalta a importância de plataformas como “Adultos no Espectro“, que oferecem suporte acessível e trabalham contra o capacitismo na sociedade. Ela menciona o estigma enfrentado por adultos autistas de suporte nível 1, que muitas vezes são vistos como “menos autistas” pela própria comunidade neurodivergente, o que pode gerar ainda mais sofrimento e exclusão.

Segundo ela, “o principal desafio de um adulto diagnosticado tardiamente com autismo é a falta de suporte nos tratamentos, especialmente tratamentos transdisciplinares”.

Pontos de apoio especializados para autistas no DF

O acompanhamento dos pacientes é realizado nos Centros de Atenção Psicossocial Infantojuvenis (CAPS i), que oferecem atendimento psicossocial e psiquiátrico. O Centro de Orientação Médico Psicopedagógica (Compp) também desempenha um papel crucial, fornecendo orientação médica e psicopedagógica. Além disso, o Centro Especializado em Reabilitação (CER II Ceal) oferece serviços especializados de reabilitação. Para adolescentes, o Adolescentro é um local importante que oferece atendimento específico. O Hospital da Criança de Brasília José de Alencar também desempenha um papel fundamental no apoio a crianças com TEA, oferecendo serviços médicos e terapêuticos especializados. Essas instituições trabalham em conjunto para proporcionar um suporte abrangente e de qualidade para os autistas e suas famílias na região.