Foto BSB: festival de fotojornalismo retorna em sua terceira edição

“Resiliência: habitar na emergência climática” é o tema escolhido para 2024

Enzo Bernardes

Postado em 04/05/2024

O Foto BSB é o primeiro festival dedicado exclusivamente ao fotojornalismo brasileiro, promovendo a discussão e a promoção de fotografias documentais. As duas primeiras edições do festival ocorreram online em 2020 e 2022. Em 2024, é primeira vez que o evento terá programação híbrida.

A edição, iniciado em março, traz ensaios relacionados a crises climáticas, moradia e mudanças, e exibirá 12 vídeos a cada 15 dias na plataforma Youtube, com encerramento de maneira presencial nos meses de agosto e setembro. O projeto é financiado pelo Fundo de Apoio à Cultura (FAC), que cobre todos os custos relacionados às exposições e cachês de palestrantes.

Cronograma Foto BSB 2024. Reprodução: Foto BSB.

Dani Lobo, idealizadora do evento, diz que a ideia do festival surgiu após ela perceber que havia uma lacuna no segmento do fotojornalismo, mesmo havendo diversos outros festivais de fotografia pelo país.

“Quando eu estava atuando como diretora de ação cultural da FNAC tive a oportunidade de organizar diversos eventos que abrangiam diferentes áreas, como fotografia, histórias em quadrinhos, festivais de música, entre outros. Quando surgiu um edital do FAC em 2019, que era específico para projetos de fotografia, quis dar continuidade ao evento de fotografia que promovia lá. Decidi, então, propor a criação de um festival de fotografia com foco em fotojornalismo”, explica.

Ela completa explicando que o princípio fundamental do Foto BSB é difundir e democratizar os debates fotojornalísticos, abrindo espaço para discussões diversificadas, com foco em questões relacionadas aos direitos humanos e ao meio ambiente. 

Além disso, dar visibilidade aos fotojornalistas que estão em constante produção é outro ponto visto no festival.

“O maior mérito do festival é dar visibilidade a quem está fazendo material que não está saindo nos meios de comunicação tradicionais, que são pouquíssimos e por algum motivo não se interessam pelas produções. Independente disso, tem muita gente fotografando, fotografia fotojornalística ou documental, e essas pessoas estão escondidas. Cabe ao festival tentar mostrar esse tipo de trabalho, esse tipo de fotógrafo para um número cada vez maior de pessoas”, diz Claudio Versiani, jornalista e curador do Foto BSB.

A crescente urgência de abordar a crise climática foi o que definiu o tema: “Resiliência: habitar na emergência climática”. O projeto potencializa a necessidade de discutir como as mudanças climáticas estão prejudicando e forçando comunidades a se adaptarem e, muitas vezes, perdendo seus lares.

“Esse é um tema que está afetando todo mundo, então nós queríamos que os fotógrafos mostrassem essas novas realidades, como está aquele lugar alagado, aquele lugar afetado pela maré. Queremos ver essas imagens que mostram como as pessoas estão se adaptando a tudo isso”, diz Zuleika de Souza, fotojornalista e também curadora do Foto BSB.

Ela explica também que o objetivo é consolidar que o festival aconteça pelo menos de dois em dois anos, obtendo mais verba para investimentos em palestras, exposições e publicações de catálogos que determinem o projeto como um documento.

Indígenas Tembés da aldeia Turé Mariquita em Tomé Açú no estado do Pará . Amazônia ©️ João Roberto Ripper / Imagens Humanas

Algo que marca o Foto BSB é a iniciativa de homenagear um fotógrafo de destaque a cada edição e em 2024 o prestigiado é João Roberto Ripper.

“Toda vez que a gente recebe uma homenagem e um carinho feito pelos próprios colegas, é um prazer muito grande, é uma emoção, é uma gratidão. Eu tive a minha vida baseada em manter minhas convicções. Mantê-las com os custos e com as derrotas que ela pode e que me impôs na vida”.

O papel transformador do fotojornalismo

O fotojornalismo é uma junção de elementos jornalísticos, artísticos e sociais, que somados criam retratos de momentos cruciais na história. Além de criar uma narrativa, o fotojornalismo procura provocar reflexões por meio de retratos capturados a fim de representar a realidade de forma crua.

“Trazer ao máximo a amostra da verdade para as ideologias dos veículos e dos poderes. Isso vai ser cada vez mais forte e cada vez a ética profissional vai ter que estar muito firme, para inclusive não temer a demissão, uma vez que o mercado de trabalho vai ser mais restrito, as pessoas vão temer e você não pode mentir por medo. Eu acho que, além disso, uma reação para que a realidade não seja moldada aos interesses de cada um, é fazer o jornalismo independente cada vez mais forte”, diz Ripper.

Ripper explica também que os festivais e o fotojornalismo tem um papel conscientizador a fim de diminuir injustiças e violência na sociedade.

“As investidas contra os direitos fundamentais do homem vem a toda hora, e temos que estar firmes pra isso. Acho que tem um contexto cultural, tem que abrir espaço para mais projetos, para mais coisas, e isso vai ser cada vez mais importante na conscientização e na mudança social. Temos que fazer documentarismo, jornalismo, fotografia para ajudar nas mudanças sociais, para que o Brasil seja melhor, para que as injustiças sejam menores e os festivais tem que contribuir, afinal, esses são os legados que os festivais são obrigados a ter”, reitera.

Populações Tradicionais de apanhadores de flores Sempre Vivas situadas na Serra do Espinhaço em Diamantina, Minas Gerais. ©️ João Roberto Ripper / Imagens Humanas
Preto-Forro, Engenho Novo, Rio de Janeiro, Brasil, 1977. ©️ João Roberto Ripper / Imagens Humanas

Na visão de Zuleika, o fotojornalismo não se restringe apenas ao profissional:

“A fotografia que as pessoas fazem do dia a dia também é fotojornalismo. Mas tem que ter um debate sobre essa fotografia: como vai se armazenar, existem várias discussões da pós-verdade e também de edição, as imagens estão muito editadas. O festival serve para refletir sobre tudo isso”, diz.

Muito do que se vê das produções do dia a dia se deve às redes sociais. Plataformas como o Instagram, Twitter e Facebook permitem aos fotojornalistas a exporem seus trabalhos de maneira que possibilita maiores interações e contato com o público.

“O Instagram ajudou a popularizar a fotografia e fez uma alfabetização visual. Antigamente, os álbuns fotográficos de pessoas que não eram fotógrafos tinham erros como cabeças e pés “cortados”. Hoje ninguém mais faz foto ruim, no início do Instagram as pessoas postavam muita foto ruim, hoje só tem foto boa. E as pessoas vão muito além, tenho amigos que viraram fotógrafos depois do Instagram, após ver as imagens e se inspirar”, completa.