Laços de tinta: tatuagens entre amigos vira tendência
Objetivo é compartilhar memórias e sentimentos
Postado em 16/04/2024
As tatuagens há muito tempo deixaram de ser apenas símbolos de rebeldia ou individualidade. Nos últimos anos, uma tendência tem ganhado força: as tatuagens de amizade. Elas são uma maneira de simbolizar relacionamentos significativos. Representam laços profundos, amor, amizade e confiança. Quando duas pessoas decidem tatuar algo juntas estão declarando publicamente a conexão especial.
O tatuador João Victor Pereira observa que atualmente as pessoas estão mais conscientes ao fazer tatuagens que representam amizade, optando por desenhos fofos ou complementares, como duas metades de um abacate ou chave e cadeado. “Eu recomendo que escolham desenhos que, se algo acontecer, não fiquem marcados como uma tatuagem explícita de amizade, como personagens ou frases”.
Segundo ele, tatuagens de amigos geralmente não geram arrependimentos, ao contrário das tatuagens feitas em relacionamentos, especialmente quando feitas impulsivamente no início do relacionamento. Ele inclusive oferece desconto na cobertura dessas tatuagens.
Laços permanentes ou temporários?
Manuella Penha decidiu fazer uma tatuagem em apoio a um amigo que enfrentava uma profunda depressão. Com medo de perdê-lo, ela escolheu demonstrar o quão importante ele era. A tatuagem, um sinal de ponto e vírgula, simboliza uma pausa, não o fim, refletindo a mensagem de que essa fase difícil não é o final da história, mas apenas um momento passageiro. A decisão de tatuar-se foi uma forma de mostrar apoio e continuidade Ainda hoje, ela afirma que nunca se arrependeu da tatuagem, nem cogitou cobri-la.
“No dia que fiz e mostrei para ele foi um dia muito importante para mim e para ele, ele chorou bastante e me agradeceu por não ter desistido dele, assim como outras pessoas fizeram.” – Manuella Penha
Já Camyle Soares teve uma experiência diferente. Ela fez uma tatuagem com uma amiga de infância, acreditando que a amizade seria duradoura e querendo eternizá-la na pele. No entanto, ela expressou arrependimento pela decisão e afirmou que não faria outra tatuagem com alguém tão cedo. A tatuagem, feita aos 13 anos, foi um ato impulsivo e feito sem considerar as consequências futuras.
“Após cortarmos todos os laços, a tatuagem tornou-se sem sentido para mim, representando agora uma falsidade e o fim da amizade. Acho que, se ainda fossemos amigas, talvez não consideraria a tatuagem tão fútil.” – Camyle Soares
A história de Gabriel Mussuri e Arthur Cedric é um tanto quanto cômica e curiosa. Gabriel conta que tatuou a palavra “put*ria”, enquanto seu amigo Arthur tatuou a palavra “amor”. Ele descreve a tatuagem como algo “horroroso”, mas que representa a amizade entre dois amigos totalmente opostos. Apesar de ter passado pela cabeça dele se arrepender da tatuagem, ele valoriza a amizade com Arthur, que é uma das melhores pessoas que já conheceu. Ele é padrinho de casamento e do filho de Arthur, o Yohan, que considera uma grande bênção em sua vida.
Apesar das críticas da família e da atual namorada, que não gosta da tatuagem, o entrevistado encontra humor na situação e conta que um MC que ele admira tem uma música com o mesmo nome da tatuagem. Quando ele mencionou isso ao artista, foi convidado para curtir o show junto com ele.
” Ela representa dois melhores amigos sendo totalmente diferentes um do outro.” – Gabriel Mussuri
Ethyellen Fortunato revelou que a principal motivação para fazer a tatuagem foi eternizar e simbolizar a amizade com sua amiga. Para ela, a tatuagem representa uma história de vida e reciprocidade. Apesar dos anos, ela não se arrepende da decisão e nunca pensou em modificá-la, pois a tatuagem ainda carrega o mesmo significado de quando foi feita.
“Decidi fazer a tatuagem após passar por um momento difícil em minha vida e essa amiga esteve sempre do meu lado em todo o processo. Se hoje estou aqui foi porque tive muito apoio, amor e carinho dessa pessoa. Fazer essa tatuagem é eternizar esse momento.” – Ethyellen Fortunato
Veja o que os estudos dizem sobre o comportamento
No estudo “Suspensão corporal: Novas facetas da alteridade na cultura contemporânea” realizado por Daniel Lirio e publicado em 2010, são apresentadas 20 razões para a modificação do corpo. Essas motivações englobam aspectos como arte, prazer, memória, elaboração de experiências, autoestima, completude, expressão individual/diferenciação, oposição, superação de limites físicos, prazer e/ou superação da dor, diversão, cuidado pessoal, empoderamento do corpo/sensação de estar vivo, integração em grupos minoritários e sensações sexuais.
Por outro lado, no estudo “Tatuajes: Una Mirada Psicoanalítica” de REISFELD, S., os jovens afirmam não saber exatamente por que escolheram determinada imagem para tatuar, fato que não os perturba nem impede que um significado seja construído posteriormente. A autora argumenta que a fascinação visual está ligada a uma absorção inconsciente e à influência do “outro”, elementos que adquiriram uma importância extraordinária na sociedade contemporânea. Diante da falta de motivação consciente, a autora sugere que essa absorção está relacionada ao processo edípico, pois toda imagem carrega consigo identificações. Em sua análise, uma parte da onipotência infantil tende a persistir na aura mágica das tatuagens, enquanto tendências regressivas e aspectos imaturos da personalidade são mantidos nos modelos idealizados da vida mencionados pelos seus entrevistados.