“Ninguém faz cinema no Brasil na esperança de ficar rico, é por amor mesmo”
Diretor e roteirista de cinema, Lino teve seu primeiro longa-metragem exibido na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
Postado em 06/11/2021
Egresso do curso de Cinema do Centro Universitário IESB, a história de Lino Meireles como cineasta começa cedo. Ele cresceu em meio a uma família que sempre admirou o cinema, e com isso, a vontade de criar e contar histórias apenas cresceu.
Lino dirigiu e roteirizou o documentário “Candango: Memórias do Festival”, que conta a história do Festival de Cinema de Brasília, um grande marco da resistência cultural e política brasileira. O longa explora a jornada desse evento ao longo desses anos, desde sua inauguração em 1965, um ano após o início da ditadura militar.
Em 2020, o documentário foi exibido na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Em entrevista, Lino conta que, por mais que a mostra tenha acontecido em meio a pandemia, foi uma experiência única e gratificante, e que guarda apenas as coisas positivas que aconteceram. Confira a entrevista.
Como e onde você diria que sua biografia começa? Estudar cinema foi sempre um sonho? Sempre quis ser diretor e roteirista?
Acho que minha biografia começa dentro de uma família cinéfila. Nasci em 82, então na minha geração ainda íamos, a família toda, ao cinema como um programa de final de semana. Via filmes uma vez e depois ficavam só na memória, até que, talvez, meus pais achassem em alguma viagem uma fita VHS da lista que eu sempre montava. A cinefilia é algo que vai acumulando na vida, para alguns nunca passa, e eu sou um destes. Quando comecei a pensar em estudar cinema, a vontade era sempre de estar no núcleo de criação de uma história, de uma narrativa, e são os papéis de roteirista e diretor que melhor refletem isso.
E como você descreveria os anos que passou estudando no IESB?
Estudei no IESB entre 2008 – 2021. Fiz faculdade à noite, porque eu já era formado e estava trabalhando durante o dia. A turma da noite era sempre bem diversa, tinham várias pessoas mais velhas, que como eu, iam direto do trabalho, e pessoas bem novas, que, por quererem estudar a noite, já indicam certas características interessantes. Ninguém faz cinema no Brasil na esperança de ficar rico, é por amor mesmo, então a turma é sempre uma das melhores.
Em quais projetos, longas ou curtas, você já trabalhou anteriormente? Seja na posição de diretor, roteirista ou outras.
Quando estava na faculdade, participei de todas as posições possíveis. Fotografei, escrevi, fiz arte, e até atuei, tudo com resultados temerosos. Mas na faculdade é assim, hora de explorar, afinal estamos fazendo tudo entre colegas. Isso é tão verdade que, depois da formatura, não fiz nada de cinema por 2 anos. Deixar de conviver diariamente com a turma de cinema é uma tragédia, os outros ritmos da vida acabam nos dominando. Em 2014 tirei um roteiro da gaveta e decidi que dirigiria um curta-metragem onde eu seria o único não-profissional, e justamente o diretor. Me juntei a um colega da minha sala como produtor, e montamos a equipe. A ideia do meu primeiro longa-metragem, o documentário, veio em 2016.
Como foi a experiência de participar da 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em 2020, em meio a pandemia?
Foi algo muito gratificante, sem dúvidas. Tem aquele negócio de ser o primeiro longa-metragem, e conseguir entrar num festival de grande porte no país, uma grande vitrine e um atestado da importância do filme. É claro que não poder participar de sessões presenciais é um abalo, até hoje nunca vi meu filme numa sala de cinema ou com uma platéia de desconhecidos.
Por que produzir o documentário “Candango: Memórias do Festival”? Quais foram suas motivações?
Frequento o Festival há anos, e foi durante a mostra de 2017 que tive a ideia. Eu nunca havia assistido um documentário sobre um festival de cinema, e só de perceber isso, já achei que seria algo único. Só que pensei que seria um artefato mais local. Começamos a ligar para várias pessoas, pedindo um tempo de entrevista, meio que sem saber o que faria com aquilo no final das contas. Aliás, eu sabia apenas que queria perguntar sobre memórias pessoais passadas no Festival. Todo mundo aceitava. Quando pensamos em expandir para fora de Brasília, todos aceitavam uma conversa também, foi surpreendente. E pra mim foi uma experiência surreal, pois consegui sentar e conversar sobre filmes com grandes nomes do nosso cinema apenas pelo interesse destas pessoas em contribuírem à memória do Festival.
Pensando que o documentário trata sobre o Festival de Cinema de Brasília, o que esse festival significa para você? E para o cinema local, nacional ou até mundial?
Isso remete um pouco à pergunta anterior. O Festival de Brasília é tão amado por quem passa por lá, que todos têm a maior vontade de ceder tempo para homenageá-lo. Considerando que o Festival começou em 1965, e acontece até hoje, podemos dizer que a história do cinema brasileiro passa pelo Festival, quase que obrigatoriamente. Até hoje, todos os movimentos cinematográficos que se sucederam ao Cinema Novo despontaram lá. Fico muito feliz de poder mostrar ao espectador este aspecto de minha cidade, e mostrar a formação que ela tem em nossa cultura cinematográfica.
Quais são os próximos passos de Lino Meireles? Está trabalhando em outro projeto no momento? O que acontece daqui para frente?
Este documentário me levou a trabalhar muito com a memória de nosso cinema. Acabo de voltar da Mostra SP 2021 após apresentar o filme “Já que Ninguém me Tira pra Dançar”, em que fui co-produtor da diretora Ana Maria Magalhães. Até hoje é o primeiro documentário já realizado para o cinema sobre Leila Diniz, uma figura única em nossa história cultural. Além disso, estou produzindo uma restauração em 4K de um dos filmes fundamentais de nossa história, “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, de Glauber Rocha. Conheci a filha dele, Paloma, durante a produção do meu documentário e estamos juntos nesta. Depois de concluído e relançado, acho que gostaria de voltar a pensar em ficção.