Golpes virtuais disparam e colocam o DF em alerta

Com mais de 26 mil ocorrências registradas em 2024, DF se torna um dos principais alvos de ataques virtuais no país. Falta de investimento em segurança pública digital preocupa especialistas e policiais civis.

Giovanna Sfalsin Santos

Postado em 30/04/2025

Em 2024, foram registrados um estelionato virtual a cada 28 minutos – (Crédito: Freepik)

Dispositivos móveis invadidos, dados bancários roubados, golpes via WhatsApp, clonagem de identidade, extorsão, cyberbullying, vírus e malwares. Esses são apenas alguns exemplos dos perigos enfrentados diariamente pelos cidadãos diante do crescimento acelerado dos crimes cibernéticos. No Distrito Federal, a situação é alarmante: foram registrados 26.696 crimes cibernéticos em 2024, segundo a Polícia Civil do DF (PCDF). Destes, 69,6% (18.572 casos) foram estelionatos virtuais — uma média de um golpe a cada 28 minutos.

A explosão nos números deixa Brasília entre as regiões mais afetadas do país, atrás apenas de Santa Catarina, Minas Gerais e Pará no ranking nacional de estelionato digital, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024. O Brasil, por sua vez, ocupa a segunda posição mundial em tentativas de ataques virtuais, atrás apenas dos Estados Unidos.

A situação tem gerado críticas e cobranças por parte dos profissionais da segurança pública. O Sindicato dos Policiais Civis do Distrito Federal (Sinpol-DF) afirma que a capital federal se tornou um “firewall fragilizado”, ou seja, uma barreira vulnerável diante da sofisticação do crime digital e da falta de investimentos na estrutura e valorização dos investigadores.

Golpes comuns

A moradora de Santa Maria, Marta Campos, de 42 anos, foi vítima de um dos golpes mais comuns praticados por criminosos digitais: a clonagem de WhatsApp. “Recebi uma mensagem e parecia mesmo ser minha prima. Tinha a foto dela, falava do jeito dela. Me pediu ajuda para pagar uma conta urgente, disse que estava com problema no aplicativo do banco”, contou.

Sem desconfiar de nada, Marta transferiu R$2.900 para a chave PIX enviada pela suposta parente. “Eu estava no trabalho, distraída. Fiz a transferência e só depois, quando falei com ela por telefone, percebi que era golpe. Fiquei arrasada”, relatou.

Marta registrou boletim de ocorrência, mas sabe que recuperar o valor é improvável. “A gente se sente impotente. É um prejuízo financeiro, mas também emocional. Desde então, fico desconfiada até da minha sombra”, desabafou.

Sobrecarga

Diariamente, investigadores da Polícia Civil lidam com operações complexas para rastrear e desarticular quadrilhas digitais. Para o agente da PCDF Ulisses da Nobrega, que atua na investigação de fraudes cibernéticas, a sofisticação dos crimes é um dos principais desafios. “Os golpistas usam inteligência artificial, programas espiões e técnicas de ocultação digital que dificultam a identificação. Felizmente, temos evoluído tecnicamente, mas a demanda cresceu demais”, explica.

“Hoje, todas as delegacias têm estrutura para investigar crimes virtuais. A Escola Superior de Polícia Civil (ESPC) foi essencial para isso”, afirmou. No entanto, ele alerta para um obstáculo crescente: a demanda explodiu, mas o efetivo policial continua limitado. “O número de casos praticamente dobrou, e isso tem gerado um cansaço acumulado e desgaste psicológico nos investigadores”, disse.

Segundo ele, a Escola Superior de Polícia Civil tem sido fundamental para capacitar os investigadores. “Hoje, todas as delegacias da capital têm preparo técnico para lidar com crimes virtuais. No entanto, o aumento exponencial das ocorrências tem causado sobrecarga, cansaço e desgaste psicológico entre os agentes”, apontou.

Em novembro de 2024, a PCDF desarticulou uma quadrilha que operava com malware e falso antivírus. Os criminosos se passavam por bancos e induziam as vítimas a instalar um software que, na verdade, dava acesso remoto a seus celulares. A operação bloqueou mais de R$1 milhão em contas bancárias fraudulentas e apreendeu dinheiro vivo em residências dos suspeitos.

Já em fevereiro deste ano, outra operação revelou um esquema de phishing contra servidores do Governo do DF. Uma das vítimas, uma idosa de 60 anos, teve R$340 mil subtraídos da conta bancária. A ação resultou na prisão de cinco pessoas em São Paulo.

É recomendado ficar atento à mensagens e ligações – (Crédito: Freepik)

Alerta vermelho

De acordo com levantamento da Kaspersky, entre junho de 2023 e julho de 2024, o Brasil sofreu 725 milhões de tentativas de ataques virtuais, representando 63% de todos os casos da América Latina. Apesar de uma leve queda de 16% em relação ao período anterior, os números reforçam o alerta para a urgência no reforço da cibersegurança pública.

Para o Sinpol-DF, isso inclui a valorização dos policiais civis, ampliação do efetivo, aquisição de equipamentos tecnológicos e treinamento contínuo. “A segurança virtual da população depende diretamente do trabalho das polícias investigativas. Mas, se não houver reforço imediato, a estrutura vai colapsar. O DF, que deveria ser uma fortaleza digital, está exposto como um firewall fragilizado”, afirma Enoque Venâncio de Freitas, presidente do sindicato.

A PCDF recomenda que a população desconfie de ligações de bancos pedindo para instalar aplicativos, evite clicar em links desconhecidos e utilize autenticação em duas etapas.