Maio Amarelo mobiliza e chama atenção para a responsabilidade no trânsito
Campanha alerta para o papel de cada indivíduo na construção de um trânsito mais humano e seguro.
Postado em 04/06/2025
No Brasil, a cada dia, 92 pessoas perdem a vida no trânsito. Em 2023, foram 34.881 mortes, um aumento de 2,91% em relação a 2022. Diante desse cenário, o Movimento Maio Amarelo surge como um chamado à consciência coletiva, à empatia e à ação. Mais do que uma campanha simbólica, o Maio Amarelo busca provocar mudanças concretas nos comportamentos e na cultura viária do país.
Com o lema “Desacelere. Seu bem maior é a vida”, a campanha visa estimular a reflexão sobre a cidadania nas ruas, enfatizando o respeito entre motoristas, pedestres, ciclistas e motociclistas. O amarelo, cor que simboliza atenção e sinalização no trânsito, é o emblema de uma luta urgente por vidas preservadas.
Segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), somente em 2024, o Brasil registrou 6.160 mortes e 84.526 feridos em acidentes nas rodovias federais. Um dado ainda mais preocupante diz respeito aos motociclistas: em 2023, 13.500 mortes envolveram esse grupo, representando 38,6% das fatalidades no trânsito. A faixa etária mais atingida está entre 20 e 29 anos, reforçando o impacto da imprudência especialmente entre os jovens.
Vivências que alertam
Jean de Souza, que já foi ciclista assíduo em Brasília, relata que sua rotina sobre duas rodas era marcada por planejamento e cuidados. “Mesmo assim, eu não me sentia seguro. Apesar de Brasília ter uma malha cicloviária extensa e bem sinalizada, ainda há pontos de interseção com as vias dos veículos”, contou.
A presença de ciclistas no trânsito exige atenção dobrada de todos os condutores / Foto: Paola Cieglinski O ciclista precisa de sinalização luminosa em sua bicicleta, além de usar equipamentos de proteção para prevenir acidentes / Foto: Paola Cieglinski
Jean conta que sofreu um acidente enquanto pedalava em uma via sem ciclovia, mencionando que a queda ocorreu em alta velocidade. Segundo ele, o fato de estar totalmente protegido foi o que minimizou os danos. Ele também destacou que há um medo constante entre os ciclistas, o que, infelizmente, causa insegurança e provoca mudanças em seus comportamentos.
Na sua opinião, a empatia entre os diferentes atores do trânsito existe, mas ainda é limitada. “Acredito que sim, pois observa-se no trânsito muitos motoristas conscientes da importância de ter cuidado com os ciclistas. Existem casos omissos, mas acredito”, afirmou.
Já Terezinha de Jesus, sobrevivente de um grave acidente em 1984, ainda carrega marcas emocionais, pois afirma ter sido um episódio horrível, do qual não consegue se esquecer até hoje. O acidente ocorreu numa estrada em Santa Catarina, durante uma forte chuva.
No momento em que seu veículo se preparava para entrar na via principal, um carro saiu repentinamente de uma via secundária, fazendo com que fossem arremessados para a pista contrária, onde colidiram com um caminhão carregado de tijolos. Terezinha acredita que falta educação, empatia e humanidade no trânsito e questiona a eficácia das campanhas: “Acho que não conseguem mobilizar as pessoas para ter mais responsabilidade no trânsito e dirigir com mais cuidado”.
Especialistas apontam soluções e destacam o papel da cidadania
Para o especialista em mobilidade urbana Artur Morais, a segurança no trânsito está baseada em três pilares: engenharia, educação e fiscalização. “Se um desses faltar, não tem como você ter segurança. Você vai ter risco no trânsito”, afirmou.
Ele considera o motorista o maior empecilho e, ao mesmo tempo, a possível solução para os problemas no trânsito. Afirma que quase a totalidade dos acidentes ocorre como resultado de infrações cometidas de forma consciente. Para ele, se os motoristas cumprirem as regras, será possível reduzir significativamente o número de acidentes.
O especialista acredita que formar condutores não basta: é preciso formar cidadãos. “Ensinar a dirigir é fácil; o que precisa mesmo é ensinar a ser cidadão, ensinar a ter responsabilidade, a respeitar as leis de trânsito”.
O professor da Universidade de Brasília (UnB) e especialista em trânsito, David Duarte, destaca o desequilíbrio da cidadania nas vias. “Tem cidadania para alguns, motorizados, por exemplo, e menos cidadania para outros, como pedestres, ciclistas e outras pessoas vulneráveis, devido à sua condição de circulação na cidade.

Para ele, o trânsito brasileiro reflete uma cultura do egoísmo. Observou que o trânsito é marcado por atitudes egoístas e que, quanto maior e mais potente é o veículo, menor costuma ser o respeito pelos mais frágeis.
David reforça que mudar esse cenário exige investir em infraestrutura segura, educação desde a infância e fiscalização eficaz. “A fiscalização no Brasil é uma peneira. Há um número enorme de infrações cometidas que não são detectadas.”
Ele também faz um alerta sobre os motociclistas: “A moto já é um veículo pelo menos 20 vezes mais perigoso do que um carro. Metade de todos os mortos no trânsito é de motociclistas e 8 em cada 10 feridos também”.
Um chamado à ação coletiva
Transformar o trânsito exige mais do que campanhas: exige mudança de comportamento, compromisso com o outro e fortalecimento do senso de comunidade. Como destaca Jean: “É preciso cuidado e atenção constantes, pois à frente pode haver um ciclista. Como diz o Código de Trânsito, o maior cuida do menor”.
O Maio Amarelo é, acima de tudo, um lembrete de que cada decisão no trânsito pode salvar — ou tirar — uma vida. “Volto a afirmar que a educação é fundamental. A base de tudo é responsabilidade, consciência ao dirigir e empatia com o seu semelhante”, concluiu Terezinha de Jesus.
Na avaliação do especialista David Duarte, campanhas como o Maio Amarelo precisam sair do papel e alcançar a prática cotidiana. “Cada vez que você anda no trânsito — seja a pé, de carro, de bicicleta, inclusive como passageiro —, você tem que obedecer às regras básicas de convivência”, reforça. Para ele, o respeito à sinalização e às normas não deveria depender da fiscalização, mas da consciência de que o espaço urbano é coletivo.