Marcelo Bechler, jornalista da TNT Sports em Barcelona, fala sobre futebol e carreira
Com quase 800 mil seguidores nas redes, Bechler se destaca na cobertura esportiva
Postado em 30/05/2025

Jornalista esportivo há quase 20 anos, responsável por furos jornalísticos no futebol internacional e entrevistas com lendas do esportes, Marcelo Bechler é referência na área. Nascido em Belo Horizonte, Minas Gerais, desde pequeno sabia que seu lugar era no futebol. Ainda criança, demonstrava facilidade em imitar apresentadores de TV e rádios que comentavam sobre esporte.
Aos 12 anos, ele e um amigo criaram um jornal do prédio onde moravam. Falavam sobre jogos que aconteciam no local, entrevistavam moradores, diagramavam e imprimiam na gráfica para distribuir os exemplares no condomínio. A experiência o fez perceber que levava jeito para o jornalismo, além de o aproximar da sua verdadeira paixão: o futebol.
Após anos trabalhando como repórter na TV Bandeirantes e no SportTV, movido pelo sonho de morar em Barcelona, Marcelo pediu demissão da Rádio Globo em 2015 para tentar uma nova vida na cidade catalã. Segundo o jornalista, esse foi um dos grandes desafios na sua trajetória. Marcelo se mudou para um lugar com cultura e idioma diferentes, sem a garantia de estabilidade ou carreira no novo país.
Após alguns meses trabalhando fora da cobertura do futebol, Bechler foi indicado para compor a equipe de correspondentes na Europa do Esporte Interativo, atualmente conhecido como TNT Sports, onde ele trabalha acompanhando o FC Barcelona, um dos maiores clubes de futebol do mundo. Além do time blaugrana, Marcelo também cobre grandes jogos de competições europeias como Champions League, La Liga, Copa del Rey e entre outros.
Bechler é conhecido por furos importantes na comunidade esportiva, como a transferência de Neymar para o time Paris Saint Germain, e a tentativa de Lionel Messi de rescindir o contrato com o Barcelona em 2020. O jornalista trabalhou em diversos canais de comunicação como a Rádio Itatiaia e o jornal desportivo Lance!
Qual foi um momento marcante da sua carreira?
Talvez eu não consiga escolher um. Eu lembro que a melhor sensação que eu tive foi depois de entrevistar o Messi, mas foi uma entrevista curta e que a gente queria que fosse maior. Acabou que pela divisão que a gente teve ali na hora a gente não conseguiu uma posição de TNT Sports Brasil e TNT Argentina, tivemos que dividir entre os dois, então ficou uma entrevista bem menor do que estava combinado, e essa entrevista já estava batendo na trave há muito tempo para acontecer.

Eu lembro que depois a sensação foi muito boa de que finalmente eu tinha vencido aquela barreira de conseguir, de alguma forma, entrevistá-lo em algum momento. Foi muito legal.
Eu lembro da primeira vez que eu entrei no ar, eu tinha 19 anos, eu estava pensando nisso hoje. Eu acho que foi em 20 de agosto de 2006. A primeira vez que eu entrei no ar na Rádio Inconfidência de BH, até hoje eu lembro do dia, assim, de como tudo aconteceu, e aquilo ali foi marcante. Eu lembro do meu primeiro jogo no Mineirão, eu lembro do primeiro jogo que eu comentei, a primeira vez que eu fiz um programa no SporTV.
Então, eu lembro de muita, muita coisa. Tudo foi muito importante para o próximo passo. Todo degrau de uma escada é importante para o próximo.
Como jornalista, fazer entrevistas é algo comum na sua rotina. Entre tantas, qual foi a entrevista mais legal que você fez?
Eu fiz uma com a Marta em 2017 aqui em Barcelona, acho que eu gostei bastante. Foi a única vez que eu pedi foto para um entrevistado. Nunca pedi, acho muito antiprofissional pedir foto, não peço. Mas com a Marta eu pedi. Eu falei: “Pô, eu queria muito”. Eu gostei muito porque falou fora do futebol e tal, falou de bastante coisa bem legal. A Marta levanta bandeiras importantes, para o futebol feminino e não só para para o futebol feminino, mas acho que para as mulheres como um todo. Então foi legal de fazer.
Eu fiz a Alexia Putellas também em julho do ano passado antes das Olimpíadas, que também foi bem legal. A Alexia já não gosta tanto de falar de empoderamento feminino porque ela fala que ela também gosta de falar de futebol, que ela pode falar disso toda hora, ela só fala disso e nunca vai ser vista como uma jogadora. Então foi uma entrevista bem sobre jogadora mesmo, sobre volta por cima, Liga dos Campeões, Olimpíadas e tal. Eu também gostei muito.
Fiz uma com o Raphinha no ano passado, que foi legal também, porque era para ser 10 minutos, foram 50. Acho que ele estava mal, precisando falar. E depois já teve gente que me disse que aquela entrevista fez bem a ele, que ele precisava colocar coisas para fora, falar, se expor e que inclusive ele nunca tinha feito um gol em Champions, depois daquela entrevista ele não marcou no jogo seguinte, mas ele marcou depois contra o Paris Saint Germain, depois não parou mais de de marcar, essa temporada dele é o artilheiro”.

A língua catalã tem um valor simbólico muito forte para a região onde você trabalha na Espanha e para os barceloneses. Como você aprendeu o idioma?
Não é tão difícil, pelo menos para mim não foi tanto. Eu não fiz aula, eu tenho muita dificuldade de fazer aula de idiomas. Eu falo inglês, castelhano, catalão e um pouquinho de italiano, todos só de ouvido. E o que eu fiz para entender foi escutar música com a letra e a tradução.
Eu ficava olhando para uma frase e para outra e vendo como que eu conseguia entender aquilo ali, para onde que iam aquelas palavras. E depois, com as entrevistas que fiz no Barça, pude ver como as pessoas falavam, o que elas estavam dizendo e o que queriam, e assim, aprendi o contexto daquilo em relação ao futebol. Você levar o idioma para uma parte da sua vida que você tem interesse, que você gosta, te ajuda a entendê-lo.
Como saber o idioma te ajudou na sua profissão?
É muito importante para o trabalho, abre muitas portas. Me ajudou muito aqui. Eu comentei em TVs daqui programas e jogos por 2 anos na TV 3, que é a principal TV pública catalã e 1 ano na TV E, que é a TV espanhola, mas que também tem um canal em catalão. Então assim, abriu muitas portas no meu trabalho.
As pessoas no Barcelona também veem que é um estrangeiro que se dedicou àquilo, então, tem muito reconhecimento dentro do clube, entre os jogadores catalães também. Até hoje, quando tem algum jogador catalão que me vê, e que já não é a primeira vez que vai me dar entrevista, já sabe que vai ser em catalão e que ajuda sempre. É principalmente porque é uma forma de respeito ao lugar. Se você mora em um lugar que fala catalão, acho que você tem que falar catalão.
Então, se você é um estrangeiro que está aqui, eu acho que é muito respeitoso, se você está num lugar que te acolheu, que você fale a língua daquele lugar.
Como você gerencia a relação com jogadores e técnicos sem comprometer a sua imparcialidade?
Eu acho que o principal é que eles saibam que você está trabalhando, que você não tem nada contra, mas que eu também não consigo ter uma relação de amizade.
Eu acho que ter uma relação cordial, gentil, ter até uma relação próxima é muito bom porque pode ajudar todas as partes. Eu acho que a gente sabe muito pouco sobre o que acontece dentro de um clube. Então, quanto mais a gente puder ter algum tipo de entrada para saber mais, para ter mais qualidade e quantidade de informação, melhor. Mesmo que a gente não use aquilo o tempo todo. Não é toda conversa que você tem que vai virar uma matéria, um post, um breaking news.
Eu gosto de comentar muito, eu dou muita opinião. Eu sempre gostei de ter liberdade para fazer isso, então os jogadores que passaram aqui pelo Barcelona, por exemplo, eu sei que uns lidam melhor e outros pior com isso, assim, uns gostaram mais, entenderam mais e outros menos, que tem alguém opinando diariamente sobre o trabalho deles.
Mas eu acho que boa parte deles, quando vê que tem respeito, por mais que você fale alguma coisa que ele não concorde, o que pode acontecer é que te ligue, te mande uma mensagem para explicar. “Não, o que que aconteceu que não foi bem aquilo que você falou”, mas eles tendem a entender que está sendo feito com respeito alguma crítica, algum comentário.
Quais são as suas referências no meio jornalístico?
Craque Daniel e Cerginho da Pereira Nunes. São dois personagens humorísticos do Falha de Cobertura. Eu sou de uma geração que o PVC foi a grande referência para todo mundo e ele foi durante muito tempo uma grande referência para mim.
Hoje eu acho que menos, não que eu não goste do PVC, pelo contrário, continua sendo um cara excelente, só que eu acho que eu fui absorvendo outras formas de comunicar e de aprender.
Do Brasil, quem eu gosto muito e que se fala muito pouco sobre é o Gustavo Zupak, eu acho ele um cara incrível, um jornalista incrível também. É, como o comentarista, Bruno Formiga e Vitor Sérgio são ótimos. Como comunicador, André Henning e Oscar Ulisses são excelentes.
Você é torcedor do Barcelona, então como você se mantém imparcial na hora de fazer o seu trabalho? Como você mantém esse equilíbrio?

Eu acho que é porque eu estou muito acostumado a ver futebol como jornalista. Por exemplo, quando eu estou com os meus amigos, eu não gosto de falar de futebol. Eu peço para não falar de futebol, quando eu estou com família, eu falo: “Gente, futebol para mim é trabalho”, por mais que eu goste muito. Não que eu seja o santo grau do conhecimento, que eu saiba mais, mas as conversas fúteis de futebol eu não acho graça nelas.
Então, eu só gosto de conversar de futebol seriamente. Isso tira o seu lado torcedor, o lado lúdico da coisa. Eu não sei falar de futebol torcendo. Eu sei sentir, mas falar de futebol torcendo eu não consigo, eu não consigo não ver o outro lado, não consigo não ver o mérito do outro lado, eu não consigo não analisar todo o contexto, porque eu acho que eles são tantos anos fazendo isso e só fazendo isso e não vendo futebol de outro jeito que eu acabei incorporando.