Conversar é prazer: saiba como diálogo pode melhorar vida sexual

Sexóloga Alessandra Araújo esclarece o papel da comunicação no sexo.

Rafaela Machado Leite de Oliveira

Postado em 27/05/2025

Sexologia é a área do conhecimento que estuda a sexualidade humana em suas múltiplas dimensões: biológica, psicológica, relacional, social e cultural, explica Alessandra Araújo, psicóloga clínica com abordagem psicanalítica, neuropsicóloga, terapeuta sexual e sexóloga, com especialização em avaliação psicológica. 

Alessandra Araújo no consultório em que atende Foto: Arquivo Pessoal

Segundo a terapeuta, o sexólogo é o profissional especializado no campo da sexualidade humana, podendo ser psicólogo, médico ou terapeuta com formação específica. “Seu papel é acolher, escutar e intervir clinicamente em questões relacionadas ao desejo, à identidade de gênero, à orientação sexual, às disfunções sexuais e às dinâmicas afetivo-sexuais dos indivíduos ou casais, sempre respeitando a singularidade de cada história”, diz. 

Além da atuação clínica, Alessandra também é educadora sexual, preceptora de estágio, supervisora clínica e palestrante. Já contribuiu para diversas colunas sobre sexualidade, como o “Pouca Vergonha”, do portal Metrópoles.

Qual o papel da comunicação para uma relação sexual satisfatória?

A comunicação é o solo da intimidade. Ela permite que o casal compreenda os limites, fantasias, expectativas e necessidades um do outro. Quando existe liberdade para expressar o que se sente e deseja, cria-se um ambiente mais seguro para o prazer florescer. A ausência de diálogo, por outro lado, pode levar a frustrações silenciosas, afastamento e ressentimento.

Para indivíduos em busca de uma sexualidade mais livre, saudável e autônoma, quais seriam, na sua visão, os primeiros passos terapêuticos ou psicoeducacionais recomendados?

O primeiro passo é iniciar um processo de autoconhecimento, ouvindo os próprios desejos, limites e compreendendo a própria história. É importante refletir sobre como a cultura, a família e as experiências anteriores moldaram sua visão sobre sexualidade. A prática do autoerotismo também é fundamental como forma de reconexão com o corpo. Além disso, buscar informação de qualidade, com base científica, ajuda a construir uma sexualidade mais consciente. Sempre que possível, iniciar um processo psicoterapêutico é recomendado para trabalhar bloqueios, culpas ou vergonhas internalizadas.

Como você vê o impacto das redes sociais e da cultura de comparação na saúde sexual e nas expectativas dos indivíduos sobre o próprio desempenho?

As redes sociais criaram um palco onde muitas pessoas sentem que precisam “performar” uma sexualidade perfeita. Isso gera ansiedade, insegurança e uma comparação constante com padrões irreais. A erotização padronizada, a supervalorização da juventude e a objetificação do corpo impactam negativamente o desejo e a autoestima. No trabalho clínico, muitas vezes é necessário desconstruir essas imagens idealizadas para resgatar um prazer mais autêntico, conectado ao próprio corpo e à própria verdade.

Quais são, na sua opinião, os maiores obstáculos para uma comunicação sexual aberta entre os parceiros?

Vou listar os principais obstáculos com exemplos, para ilustrar melhor:

  • Vergonha e medo de julgamento: Uma mulher deseja experimentar novas formas de prazer, mas teme ser vista como “exagerada” ou “estranha”. Esse receio a impede de se expressar, criando um abismo entre o que sente e o que comunica.
  • Falta de autoconhecimento: Um homem sente desconforto durante a relação sexual, mas não sabe exatamente o porquê. Sem familiaridade com o próprio corpo ou desejos, ele não consegue compartilhar o que sente.
  • Crenças religiosas ou morais rígidas: Um casal com formação religiosa rígida evita conversar sobre sexo por acreditarem que “quem ama não pensa nisso”. Quando o desejo surge, ele é vivido com culpa, o que silencia ainda mais o diálogo.
  • Histórico de trauma sexual: Uma paciente que sofreu abuso na infância tem dificuldade de se entregar à relação. Sempre que o parceiro se aproxima, ela se retrai. Como nunca compartilhou esse trauma, ele interpreta como desinteresse.
  • Falta de tempo e rotina estressante: Casais com filhos pequenos ou trabalhos exigentes mal têm tempo para conversar. A intimidade vira exceção, o sexo se torna mecânico e a comunicação desaparece.

Que dicas você daria para casais que desejam melhorar a comunicação sexual?

Algumas orientações que costumo dar incluem: 

Criem momentos de conversa fora do contexto sexual, focando no afeto e na escuta; façam perguntas abertas com interesse genuíno, como: “O que você gosta que eu faça?” ou “O que te dá prazer?”; Usem filmes, livros ou músicas como ponto de partida para temas sensíveis; Evitem acusações. Prefiram frases como “Eu me sinto…” em vez de “Você nunca…”Se necessário, contem com a mediação de um(a) terapeuta.

Muitos casais têm dificuldades em verbalizar desejos, fantasias ou insatisfações. Quais ferramentas psicoterapêuticas você costuma utilizar para promover um diálogo mais aberto?

Utilizo uma abordagem integrativa que inclui a escrita terapêutica guiada, permitindo que a pessoa nomeie seus sentimentos antes mesmo de verbalizá-los. Também aplico técnicas da terapia do esquema, fundamentais para identificar e trabalhar crenças limitantes relacionadas à sexualidade. A psicoeducação sexual está presente como ferramenta para desconstruir mitos e ampliar o repertório de cada indivíduo. Além disso, proponho exercícios de comunicação não violenta, que favorecem a expressão do desejo de forma autêntica e sem julgamentos. E, claro, tudo isso acontece dentro do espaço analítico, que possibilita a elaboração de conteúdos inconscientes que atravessam o corpo e o desejo.

A comunicação é o solo da intimidade. Ela permite que o casal compreenda os limites, fantasias, expectativas e necessidades um do outro. Foto: Freepik