Projetos esportivos no DF transformam vidas e combatem vulnerabilidades sociais
Iniciativas promovem inclusão, cidadania e esperança em comunidades carentes do Distrito Federal.
Postado em 23/06/2025

No Distrito Federal, o esporte tem se consolidado como uma poderosa ferramenta de inclusão social, especialmente em comunidades periféricas. Iniciativas como o Futebol para Todos, da Secretaria de Esporte e Lazer em parceria com o Instituto A33, o Projeto Golfinho, da Companhia de Saneamento Ambiental do DF (Caesb), e a Rede Gol Transformando Vidas, vinculada à Vara da Infância e da Juventude do DF, têm desempenhado um papel essencial na vida de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade.
O Futebol para Todos, por exemplo, visa promover o acesso ao esporte como instrumento de cidadania, beneficiando mais de 1.300 crianças e jovens até janeiro de 2026. A proposta é simples, mas potente: usar o futebol para afastar crianças de contextos de risco e levá-las a um ambiente seguro, estruturado e cheio de perspectivas.
Já o Projeto Golfinho atende 346 estudantes da rede pública nas regiões de Ceilândia e Itapoã, oferecendo não apenas aulas esportivas, mas também atividades de educação ambiental e ações que fortalecem o desenvolvimento social. Desde sua criação, mais de 8 mil jovens já foram impactados. Esses projetos não se limitam ao esporte: eles constroem vínculos, incentivam a permanência escolar e desenvolvem competências socioemocionais, como autoestima, resiliência e responsabilidade.
O impacto real nas vidas dos jovens
O esporte, nesse cenário, torna-se um catalisador de transformação. Renan Ferreira, 16 anos, morador do Gama, é um dos muitos adolescentes que encontraram no esporte um caminho de possibilidades. “Lá em casa não tinha muito brinquedo. Eu pegava qualquer coisa e fazia de bola. Me sentia livre jogando na rua”, relembra. Foi por meio de um amigo da escola que conheceu a escolinha gratuita onde treina atualmente, voltada para meninos da comunidade.
Desde que entrou no projeto, sua rotina mudou. “Antes eu era muito agitado, faltava na escola às vezes. Depois que entrei, tive que aprender a respeitar horários, comer melhor, e melhorei minhas notas. Minha mãe vive dizendo que agora ela vê mais futuro em mim.” Para ele, esses projetos são mais do que treino: “Não é só futebol — é uma segunda casa.”
Davi Benjamim Campos, 20 anos, também viu no esporte uma saída. Natural de Ceilândia, começou a treinar aos 7 anos no SESB, levado pelo primo.
“Eu era um menino quieto, meio na minha, e ali encontrei um lugar onde me sentia parte de algo.” Mesmo com poucas condições — usava tênis gastos, improvisava equipamentos — nunca deixou de jogar. “O futebol me ensinou disciplina, trabalho em equipe e me manteve longe de caminhos errados.” Hoje, ele joga com o irmão mais velho em um time amador da cidade e reconhece: “Se mais meninos tivessem acesso a projetos assim, muita coisa poderia ser diferente. O futebol não salva o mundo, mas salva pessoas.”
Diversidade de modalidades, obstáculos em comum
Nem só de futebol vivem os projetos sociais. A pluralidade de modalidades também tem sido uma marca dessas iniciativas. O Clube e Escola de Rugby Samambaia, por exemplo, promove aulas de rugby para crianças e adolescentes, reforçando valores como respeito, disciplina e resiliência. Essas ações ampliam o leque de possibilidades para jovens que, muitas vezes, só conheciam o futebol como referência esportiva.
Mas os desafios enfrentados por essas iniciativas ainda são significativos. A falta de recursos financeiros, a precariedade de infraestrutura e a burocracia constante são entraves para a continuidade e expansão dos projetos. Muitas vezes, o que mantém essas ações vivas é a dedicação de voluntários e coordenadores que não desistem diante das dificuldades.

Paulo Henrique Coelho, responsável por ações esportivas da CAESO (núcleo da Caesb), destaca: “Hoje, eu estou nos campos, organizando competições. Trabalhei muitos anos em projetos sociais, no Brasil e também fora de Brasília. Não é fácil manter uma estrutura com poucos recursos, mas a gente resiste porque sabe o impacto que isso tem na vida dos meninos.” Para ele, o diferencial está no vínculo criado com os jovens e suas famílias. “Quando o pai ou a mãe reconhece o valor do projeto, eles também passam a participar. Isso fortalece o entorno do jovem. É aí que a transformação acontece.”
Mais de 40 anos formando vidas no coração da Ceilândia
Na Ceilândia, a Sociedade Esportiva Madureira transforma vidas há mais de quatro décadas. O projeto começou de forma despretensiosa, em um canteiro de obras, onde o pedreiro Antônio Alírio puxava uma bola com colegas durante o almoço. A brincadeira virou treino, campeonato — e nunca mais parou.
Hoje, sob coordenação de Nildo Arcanjo dos Santos, a iniciativa atende cerca de 250 jovens em três espaços públicos, sempre com uma regra clara: estar matriculado na escola. “A formação não é só no passe certo, é na disciplina, no respeito, na convivência”, resume.
O projeto acolhe jovens em situação de vulnerabilidade, muitos criados só pela mãe. Nildo lembra com carinho de um menino autista de nove anos, encaminhado por uma psicóloga. “Chegou agressivo, fechado. Hoje é um dos mais educados e comprometidos. O futebol virou linguagem pra ele.”
Alguns seguem no esporte profissional — caso de Vinícius Lago, que entrou aos cinco anos e hoje joga no Bragantino-SP. Mas os desafios seguem: falta estrutura, espaço para treinar, apoio financeiro e combate diário às drogas. “Com mais recurso, daria pra fazer muito mais”, diz. Para Nildo, o que falta para multiplicar projetos como o Madureira é simples: apoio real de políticos e empresários. “Esses meninos têm talento. Só precisam de oportunidade.”
Combate à evasão escolar e à violência juvenil
Mais do que formar atletas, os projetos esportivos têm cumprido um papel fundamental na prevenção da evasão escolar e da violência entre jovens. Segundo dados do Correio Braziliense, o DF perdeu mais de 8 mil estudantes nas redes pública e privada, sendo quase 7 mil apenas no ensino médio. Projetos como o Golfinho e o Futebol para Todos ocupam o contraturno escolar e promovem o engajamento dos jovens em práticas saudáveis.
Renan Ferreira exemplifica bem esse impacto: “Se não tiver indo bem na escola, não pode treinar. A gente aprende a se organizar, evitar confusão. O professor pega pesado, mas ensina que antes de pensar em ser jogador, a gente tem que ser homem de verdade.”
O esporte oferece regras, metas e pertencimento — elementos essenciais para manter os jovens conectados com a escola e distantes de ambientes de risco. Mais do que uma bola rolando, o que se vê é a formação de caráter, de vínculos sociais e de esperança.
Parcerias, voluntariado e engajamento comunitário
A sustentabilidade dos projetos esportivos depende diretamente do apoio institucional e do engajamento da sociedade civil. Programas como o Esporte Social Voluntário, da Secretaria de Esporte e Lazer do DF, credenciam voluntários para atuar em comunidades, promovendo inclusão social por meio do esporte.
Iniciativas como a Rede Gol Transformando Vidas integram ações desportivas, educacionais e de profissionalização, com apoio da Vara da Infância e da Juventude, ONGs e escolas. Essa articulação entre diferentes setores amplia o alcance e a efetividade dos projetos.
Para Paulo Henrique Coelho, o segredo está na combinação entre criatividade e comprometimento: “A gente sente na pele o quanto a falta de estrutura atrapalha. Mas o que não falta é vontade de estar ali, fazendo diferença. Já vimos menino que chegou calado e hoje lidera turma. Menina que sonha em ser técnica. São essas histórias que nos fazem continuar, mesmo com todas as dificuldades.”
O futuro dessas iniciativas depende, sobretudo, da valorização do esporte como política pública de base. Investir nessas ações é investir em vidas, em dignidade e na construção de uma sociedade mais justa e promissora.