Ao som de Princesa da quebrada e Rainha da favela, Negra Flow marca presença inédita no Festival Meskla

“A presença de mulheres periféricas tomando a frente em grandes eventos e na cena da música é apenas o primeiro passo para as diversas mudanças que ainda virão”, diz Nara Morais, a Negra Flow, como promessa de um futuro feminino.

Kaillane de Sousa

Postado em 27/05/2025

O festival Meskla tem se consolidado como um espaço vibrante de celebração e resistência cultural, reunindo artistas de diferentes estilos e origens em um verdadeiro mosaico sonoro. No meio desse turbilhão criativo, desponta a voz poderosa de Negra Flow, que trouxe ao palco toda a força de sua música e de suas raízes.

Durante entrevista, a artista falou sobre sua trajetória, suas referências e a importância de iniciativas como o Meskla para impulsionar talentos da periferia e fortalecer as vozes negras na cena cultural. Foto por: Erick Joshua.

Você comentou que começou na música há cerca de cinco anos. O que te inspirou a entrar nessa cena?

Eu comecei na pandemia. Como eu estava em casa, com muito tempo ocioso, comecei a fazer algumas rimas. Logo depois, comecei a escrever versos. Foi quando escrevi minha música O Sistema, em 2022. Já quis fazer o clipe, que se tornou uma das minhas maiores músicas, com grande visibilidade, com mais de 15 mil visualizações na primeira semana.

Sobre o processo de escrita, suas músicas vêm mais da inspiração externa ou do que você sente por dentro?

Geralmente, é do sentimento interno. Do que está acontecendo comigo naquele momento. A partir daí, vou escrevendo os versos, as rimas, e desenvolvendo a letra.

Você é uma representante forte da periferia e da comunidade preta em festivais e shows. Como é pra você ter se tornado essa referência para tanta gente?

Acho que isso vem muito das minhas letras. Dos meus versos falando sobre a realidade da periferia, das minhas vivências do cotidiano. Isso foi alcançando mais pessoas, que começaram a se interessar pelas letras, pela musicalidade… Foi virando algo até literário.

Percebi que você tem um carinho enorme pela sua equipe — desde as bailarinas até quem cuida da produção. Quais critérios você usa pra escolher quem trabalha com você?

A primeira coisa é a entrega total ao projeto Negra Flow. A pessoa precisa estar 100% ali comigo no dia a dia, ser autêntica, alegre e educada. A gente participa de muitos eventos, muitos festivais, então é essencial que haja disciplina com os outros artistas e uma energia positiva nas apresentações. Esses são os principais critérios.

Como foi receber o convite para o Festival Meskla, um dos maiores de Brasília?

A coordenação do Meskla entrou em contato comigo e disse que eu era um dos nomes mais pedidos nos comentários da página oficial. Tinham mais de mil comentários com meu nome. Disseram que era impossível não me colocar na line. Eu acredito muito no meu trabalho e na minha música. E acredito que muitos convites assim ainda virão, porque a internet, o TikTok, YouTube, redes sociais em um todo, nos ajuda a expandir nosso trabalho.

O consolidado festival repleto de fãs presentes para os shows. Foto: Reprodução/Instagram.

Vi que no Meskla também estarão a Negrita e a Isa Marques, outras vozes que representam a periferia. Você tem contato com elas?

Sim! Conheço todas: a DJ Ketelen, a Negritah, a Isa Marques e a Duquesa também. Converso mais com a Negritah pelo WhatsApp. São artistas que admiro muito. Cada uma no seu corre. E agora, com essa junção no Mescla, acredito que tem muito potencial.

E depois do Meskla? Já tem expectativas para novos festivais?

Sim. Me vejo no Rap em Cena, no Melhor Dia (em São Paulo), e também em festivais como o Afropunk. Tenho muito interesse no Lollapalooza. Depois do Meskla, já estou confirmada no Festival Quebradas, que vai acontecer em Planaltina, organizado pela Ravena Carmo, do projeto Poesias nas Quebradas.

Como funciona a estratégia de marketing da sua equipe pra atrair mais seguidores e visibilidade?

Trabalho com impulsionamento no Instagram. Minha equipe está sempre postando, comentando, todo mundo em conjunto nas redes sociais. Tenho uma social media que acompanha fanpages, jornais. E também tenho três fã-clubes, que sempre repostam tudo. Todo mundo trabalha com o mesmo foco.

Como foi lançar o álbum Luxúria e reunir tantas pessoas nos clipes?

Quando lancei o single Notas, que tem uma pegada mais trap e fala de ostentação — porque o rap também é alegria, não só sofrimento — logo depois veio o álbum Luxuria, com nove faixas. O clipe de Notas ainda não saiu, está com data surpresa. Mas o álbum exigiu muito de mim: dedicação, isolamento, dias intensos de gravação. No Carnaval, por exemplo, fiquei três dias confinada gravando. E sempre faço questão de ter outras artistas comigo nos clipes. Isso fortalece nosso network.

Nesse processo de isolamento criativo, você prefere ficar sozinha ou tem alguém com você?

Meu esposo, o Kizzy, sempre me ajuda. Ele está comigo, dá toques importantes. Às vezes diz: “Esse verso não ficou tão legal”. Ele tem um olhar clínico, profissional. Me apoia bastante.

E qual foi a sensação de se apresentar no palco do Meskla, diante de um público tão grande e com tantos artistas renomados?

Foi surreal. Quando eu subi no palco e vi aquela multidão cantando junto, sentindo a vibe da minha música, me emocionei. Ver que tanta gente estava ali pra curtir, pra ouvir o que eu tinha pra dizer… foi uma confirmação de que todo o esforço vale a pena. Dividir a line com artistas como Mano Brown, Cabelinho e Orochi foi uma honra imensa. É um momento que vou guardar pra sempre no coração e que me deu ainda mais força pra continuar.

Sempre com um sorriso estampado em seu rosto, Negra Flow encerra com uma frase inspiradora. Foto por: Kaillane de Sousa.

O que você diria pra galera que está começando na música?

Que continuem escrevendo músicas. Que façam cursos de canto, que busquem se profissionalizar na indústria da música. É assim que se chega a palcos como o do Meskla, dividindo a line com grandes nomes.