Diante da ecoansiedade, jovens adotam novos hábitos

Reduzir o consumo de carne, aderir à moda circular e optar por meios de transporte menos poluentes são algumas das formas encontradas para lidar emocionalmente com o problema.

Beatriz de Almeida

Postado em 18/06/2025

A ecoansiedade — definida por psicólogos como a angústia gerada pela preocupação excessiva com as mudanças climáticas — cresce entre os jovens no Brasil e no mundo. Em Brasília, onde secas prolongadas e problemas hídricos se intensificam, o sentimento se torna ainda mais presente. Essa ansiedade ambiental tem provocado mudanças concretas: da adoção de práticas sustentáveis à escolha de carreiras voltadas ao meio ambiente, passando pelo ativismo político e social.

Em 2025, 24% dos jovens brasileiros dizem considerar a crise ambiental um dos maiores problemas do país. Foto: Banco de imagens/Pexels

Dados recentes reforçam o impacto desse fenômeno entre os jovens. Uma pesquisa de 2025 da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) apontou que 24% dos jovens de 18 a 27 anos consideram a crise ambiental um dos maiores problemas do país — um aumento de 243% desde 2021. Em âmbito mundial, estudo da Lancet mostrou que 85% dos jovens brasileiros veem o futuro como “assustador” em razão das mudanças climáticas, número entre os mais altos entre os países pesquisados. Em março deste ano, o Índice Cactus-Atlas registrou que adolescentes e jovens apresentam níveis de ansiedade e baixa autoestima associados à preocupação com o clima.

Para a psicóloga Jaqueline Assis, pesquisadora da Fiocruz Brasília, esse movimento emocional pode ser transformador. “A ecoansiedade não é apenas medo excessivo; é um alerta para a urgência de mudança. Quando canalizada em ações, ela fortalece a resiliência e o engajamento social.”

Mudança de hábitos como resposta emocional

Esse sentimento também tem levado jovens a reverem práticas cotidianas: alimentação baseada em vegetais, consumo consciente, mobilidade sustentável e até a redefinição de trajetórias acadêmicas são respostas concretas à sensação de impotência diante da crise.

Em vez de ficarem imobilizados pela ansiedade, muitos buscam aliviar o mal-estar climático por meio de ações práticas. Reduzir o consumo de carne, aderir à moda circular e optar por meios de transporte menos poluentes são algumas das formas encontradas para lidar emocionalmente com o problema.

“Não é só uma questão de escolha ética, é uma forma de me sentir útil. Cada vez que escolho uma roupa de brechó ou evito carne, sinto que estou fazendo minha parte em algo que parece fora de controle”, diz Larissa Souza, 21 anos, estudante de Design de Moda na Universidade de Brasília (UnB), e ativista do coletivo Roda Verde.

A sensação de urgência e o desejo de coerência entre valores e atitudes têm moldado também o consumo: pesquisas da Opinion Box mostram que 68% da Geração Z brasileira priorizam marcas com responsabilidade ambiental.

Crise climática inspira novas escolhas profissionais

Com a percepção de que o futuro dependerá de soluções sustentáveis, cresce o interesse de jovens por áreas como Engenharia Ambiental, Ciências Sociais, Arquitetura Sustentável e Direito Climático. Em Brasília, cursos voltados a políticas públicas ambientais têm registrado aumento de matrículas nos últimos dois anos, segundo dados do Instituto Federal de Brasília (IFB).

Estudantes de Engenharia Ambiental e Sanitária- UFLA, 2020.

“A crise climática não só gerou medo, mas redirecionou meus objetivos. Abandonei a ideia de trabalhar com mercado financeiro para estudar políticas públicas. Quero ajudar a evitar o que já parece inevitável”, relata Thiago Oliveira, 20 anos, aluno da Universidade de Brasília e integrante da Rede Jovem de Clima do Cerrado.

Entre as transformações mais íntimas provocadas pela ecoansiedade está o adiamento — ou até mesmo a recusa — do desejo de ter filhos. A preocupação com o futuro ambiental do planeta leva muitos jovens a questionarem a ética e a viabilidade de colocar novas vidas em um mundo instável. Uma pesquisa global publicada pela revista The Lancet apontou que 39% dos entrevistados disseram estar hesitantes em formar família por medo do colapso climático. No Brasil, essa inquietação aparece cada vez mais em relatos espontâneos, inclusive entre pessoas que sempre sonharam com a maternidade ou paternidade.

É o caso de Bruna Matos, 23 anos, moradora do Recanto das Emas e estudante de Ciências Biológicas: “Desde os 16 eu dizia que queria ser mãe, mas hoje não sei mais. É assustador pensar em criar alguém num planeta que talvez não tenha água suficiente ou que viva em constante emergência.” O relato de Bruna expressa um dilema crescente: como conciliar projetos de vida com uma consciência ambiental cada vez mais presente?

Redes sociais amplificam o medo e a mobilização

As redes sociais desempenham um papel ambíguo no cenário da ecoansiedade. De um lado, funcionam como importantes canais de informação e mobilização, dando visibilidade a causas ambientais, conectando jovens ativistas e fortalecendo o senso de comunidade. Do outro, também são fontes constantes de alertas catastróficos, imagens de desastres e previsões alarmantes que podem intensificar o medo e a sensação de impotência.


Para Ana Clara Ribeiro, mestranda em psicologia ambiental pela UnB, o excesso de informação nem sempre gera empoderamento: “Estamos hiperexpostos a conteúdos que apelam ao medo, muitas vezes sem mediação ou contexto. Isso pode gerar paralisia, em vez de ação. A comunicação ambiental precisa ser mais cuidadosa e comprometida com a construção de soluções.” A presença de influenciadores ambientais e coletivos nas redes, no entanto, também oferece um contraponto, mostrando caminhos possíveis de engajamento e ação, mesmo diante do cenário desafiador.

Ativismo como canal de enfrentamento

Ao lado das mudanças individuais, cresce o ativismo coletivo como forma de resposta emocional e política. Brasília tem sido palco de ocupações, marchas pelo clima, mutirões de reflorestamento e ações de conscientização em escolas públicas. Grupos como o Verde Jovem DF, o Coletivo Água para Amanhã e a UECO (União de Estudantes Cidadãos do Cerrado) organizam campanhas frequentes, articulando demandas com o poder público local.

Mobilização Nacional, Jovens pelo Clima Brasília, 2025.

“Muitos de nós começaram engajados por raiva ou medo. Hoje, usamos esse sentimento como força organizadora. A ecoansiedade pode ser paralisante, mas também pode ser combustível”, afirma Rafael Mendes, 22 anos, morador do Paranoá e voluntário em mutirões de restauração ambiental. Entre os eventos mais recentes estão o Mutirão do Lago Paranoá (abril/2025), com mais de 300 voluntários, e a Marcha da Juventude pelo Clima, que reuniu cerca de 500 pessoas no Eixo Monumental, em março.

Em um cenário onde o colapso ambiental deixou de ser projeção distante para se tornar experiência cotidiana, a ecoansiedade se firma não apenas como sintoma, mas como força política e cultural. Mais do que temer o futuro, parte da juventude brasileira tenta moldá-lo — entre angústias, escolhas e pequenos atos de resistência.