Protocolos específicos para lidar com casos de racismo ou injúria racial nas escolas são limitados

Levantamento feito pelo MEC revela falta de uma abordagem estruturada para a educação antirracista

Daniele Camile Ribeiro de Andrade

Postado em 28/05/2025

 Um levantamento do MEC, de novembro de 2024, revelou que apenas 36,2% das secretarias municipais de educação possuem protocolos específicos para lidar com casos de racismo ou injúria racial. Além disso, 84,5% dessas secretarias não contam com equipes dedicadas à gestão de políticas de equidade racial. Muitas escolas realizam ações pontuais, frequentemente concentradas em datas comemorativas, sem uma abordagem estruturada para a educação antirracista.

O combate ao racismo nas escolas brasileiras, segundo o Ministério da Educação (MEC), tem sido um tema prioritário. Apesar de avanços legislativos, como a Lei nº 10.639/2003, que tornou obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas, sua implementação ainda enfrenta desafios tanto no ensino de crianças quanto de jovens.

  Somente no ano de 2025, diversos casos de racismo nas escolas brasileiras foram noticiados. Não há um número exato de ocorrências registradas nacionalmente, mas a quantidade de episódios divulgados pela mídia evidencia a persistência desse problema no ambiente educacional.

 A professora Ana Maria Pinheiro, formada em Pedagogia há 15 anos, da escola EC 02 do Paranoá, observa que o tema do racismo ainda é pouco abordado nas escolas. Segundo ela, faltam ações efetivas, e poucos professores brancos se aprofundam na temática.

 “Percebo que essa temática, infelizmente, ainda é trabalhada somente no dia 20 de novembro, como algo obrigatório e com desenhos ou algum mural para lembrar a luta de Zumbi. O tema é muito amplo, mas fica preso somente a esse dia.”

Painel/mural sobre cultura afro-brasileira no Centro Educacional Lago Norte (CedLan). A Lei 10.639/03 obriga as escolas de ensino fundamental e médio a ensinarem sobre a história e cultura afro-brasileira e africana e ressalta a importância da cultura negra na formação da sociedade brasileira. Foto: Pedro França/Agência Senado

  Ana Maria também apontou que o racismo atinge professores negros, de forma muitas vezes sutil ou inconsciente por parte de quem o pratica. “Muitas vezes, quem sofre racismo se cala porque já dói tanto enfrentar isso desde o berço que não temos mais força… Ou deixa pra lá com medo de perseguições. Isso aconteceu comigo quando enfrentei uma situação dentro da escola. A escola é um lugar onde o racismo é sentido, vivido e chorado diariamente.”

 Ela ressaltou que o racismo afeta diretamente o aprendizado das crianças, pois, ao não se sentirem vistas ou aceitas por causa da cor da pele, perdem a motivação para aprender. Segundo ela, o racismo estrutural mata diariamente o desejo, a expressão, a evolução e o amor-próprio das crianças negras.

Para ela, a melhor forma de abordar o tema com resultados positivos é investir em formação antirracista dentro da escola, com projetos que envolvam todos e deem voz ao sentir das pessoas negras. “Muitos educadores brancos não se envolvem com essa temática porque não querem fazer o enfrentamento. Pensam que combater o racismo é uma luta apenas das pessoas negras. Com isso, não têm fundamentação para agir, preferem fingir que não estão vendo ou usar o discurso raso de que é ‘mimimi’.”

 Ela defende a realização de atividades diárias que ensinem as crianças a se amarem e respeitarem, com brinquedos de culturas africanas, bonecas pretas e livros diversos.

 Elma Alves, mãe de uma pré-adolescente, revela um episódio de injúria racial ocorrido na Escola São José, em São Sebastião (DF). Um colega da filha usou a expressão “cabelo de bucha e abacaxi”. Ela diz que outros apelidos maldosos são usados frequentemente no colégio. “Ela passa por cima e usa o ‘deixa pra lá’. É o que muitos pais, como eu, também fazem, mas isso só perpetua o problema.”

Elma criticou a falta de medidas efetivas por parte da escola. “A única coisa que fazem é passar na sala no dia seguinte dizendo que racismo é crime. Isso, pra mim, não é tomar atitude. Todos já sabem que racismo é crime.”

Ela também apontou a ausência de suporte psicológico e de autoridades como o conselheiro tutelar. “No último caso, disseram que iriam chamar as autoridades para conversar com os pais dos envolvidos, mas até agora nada aconteceu.”

Segundo ela, faltam ações pedagógicas diárias nas escolas, como atividades educativas, práticas antirracistas, propostas didáticas, trabalhos temáticos, projetos interdisciplinares, entre outros. “Sem essas propostas, o aluno é prejudicado tanto na vida escolar quanto psicologicamente.”

Por fim, a mãe afirma que a educação também começa em casa: “Se os pais conversassem mais com os filhos e os orientassem sobre a importância de não praticar bullying e racismo, isso não aconteceria com tanta frequência. Acredito que a escola deveria ser mais rígida, com punições adequadas, para que esses casos não se repitam.”