Feira Hippie de Ipanema é referência há quase 50 anos

A tradicional exposição de Ipanema tornou-se símbolo de resistência cultural e patrimônio imaterial do Rio.

Gabriela Nogueira de Medeiros

Postado em 23/06/2025

Em plena ditadura militar, em 1968, a Praça General Osório, em Ipanema, tornou-se um refúgio para artistas plásticos, artesãos e hippies em busca de liberdade. O que começou como um encontro informal com obras expostas em panos no chão, transformou-se na Feira Hippie de Ipanema, hoje com cerca de 600 expositores. Desde 2011 é patrimônio imaterial do Rio de Janeiro.

Para João Cardoso, guia de turismo especializado em roteiros culturais, a feira é muito mais que um ponto de venda, é um fragmento preservado da história carioca, onde o espírito colaborativo da geração hippie ainda ressoa. Segundo ele, o espaço resiste ao tempo por manter sua essência, uma mistura de produção artesanal autêntica e diversidade de influências que atraem turistas e moradores. 

Eduardo Motcceli, artista plástico, participa da feira desde 1996. Com pinceladas impressionistas e técnica espatulada, ele se define como um sobrevivente da arte, trabalhando com acrílico e óleo em temas que vão de marinhas a paisagens urbanas.  

Para Motcceli, a feira é uma vitrine global. Foi ali que conheceu marchands, galeristas e turistas internacionais que levaram suas obras para vários países. O segredo do sucesso, segundo ele, está em estudar sempre, inovar dentro de sua técnica e acompanhar as tendências indicadas por arquitetos. A feira também é um ponto de encontro multicultural, recebendo pessoas do mundo todo e gerando oportunidades constantes. 

Robson Roots, carioca da gema, encontrou na arte um refúgio diante do estresse de ser professor de educação física. Com influência da mãe, que já desenhava, começou a pintar de forma improvisada, usando compensados, fórmicas de armário e até materiais descartados. Hoje, pinta qualquer superfície sólida, mantendo viva sua filosofia de arte sustentável.  

Desde 2018, ele ocupa um espaço na Feira Hippie, conquistado graças a um amigo expositor. Para ele, a feira é essencial para artistas locais, oferecendo visibilidade a turistas nacionais e internacionais. Uma turista argentina, por exemplo, ficou tão encantada com seu trabalho que o convidou para pintar em seu estabelecimento.  

Apesar do amor pelo local, Robson critica a falta de estrutura. “A feira precisa de melhor organização, banheiros, limpeza e segurança para não perder espaço para eventos mais competitivos”.  

Wiliam Fernandes, designer gráfico, nunca imaginou que sua paixão por rock e cultura pop se tornaria seu sustento. Desempregado na área financeira, encontrou na arte uma saída criativa. Tudo começou quando resgatou LPs descartados no lixo e transformou-os em relógios, quadros e esculturas vazadas.  

Há cinco meses na geira Hippie, ele já sente o impacto. Seu público, embora variado, é formado por quem valoriza o trabalho manual. A maior recompensa, diz, é ver o brilho nos olhos de quem reconhece o valor de uma peça feita à mão.  

Wiliam alerta para a necessidade de renovação. A feira precisa de melhor estrutura para não perder artistas. Sua sugestão é ampliar para outras regiões do Rio, como Baixada e Zona Norte, dando visibilidade a talentos que hoje ficam à margem.