Consumo exagerado de telas entre crianças levanta alerta

Vício pode levar à obesidade, depressão e transtornos relacionados à falta de atenção

Felipe Machado

Postado em 21/05/2024

A geração atual está dependente de dispositivos eletrônicos. Em crianças, o uso é ainda mais perigoso. Estudo feito pela empresa de saúde britânica Lenstore Hub revela que o Brasil é o terceiro país no ranking de crianças com maior vício em telas. O resultado da pesquisa traz pontos importantes como a quantidade de horas diárias usando a internet, a porcentagem do sedentarismo e uma visão geral da avaliação da atividade física dos pequenos.

O hábito acaba influenciando no desenvolvimento infantil, trazendo debates e estudos importantes das consequências que isso pode acarretar.

De acordo com uma publicação da neuropediatra Paula Girotto, o desenvolvimento infantil é um processo de aprendizagem no qual a criança passa a moldar sua personalidade, escolhas, ações e formas de convívio social. Logo, toda atenção vinda dos pais e da escola deve se voltar para um cuidado especial para que ela cresça sem depender de algo.

Psicóloga especializada em comportamento infanto-juvenil, Isabela Fernandes explica o risco. “Quando a criança se acostuma com o uso de dispositivo eletrônico ela fica sujeita a querer mexer no aparelho sempre quando der vontade. Se não houver o controle, ela irá viciar e com isso começará a moldar seu comportamento em torno disso. Dessa forma, ela pode começar a se isolar, não fazer mais exercícios físicos, não conseguir focar direito nas atividades e mais uma série de problemas que acabam por impactar no desenvolvimento”.

Essas atitudes podem trazer problemas sérios à saúde, como a obesidade, depressão e transtornos relacionados à falta de atenção. “Eles terão que, desde cedo, tratar e buscar medidas para cuidar desse vício antes que ocasione algum diagnóstico de doença”, completa.

A neuropsicóloga Sara Coimbra explica que o processo do vício pode começar ainda quando a criança é um bebê. “Muitos pais costumam colocar aqueles vídeos e desenhos de músicas para a criança relaxar, porém isso já influencia nesse processo. O cérebro dela está em constante desenvolvimento e a partir do momento que ela começa a ver e rever aquela mesma coisa várias vezes, estimula a impulsividade da criança de necessitar assistir novamente ao vídeo ou desenho.”

Este comportamento acaba não só por afetar uma pessoa ou outra, mas sim uma geração. Por conta disso, especialistas ligam o alerta do impacto que isso irá trazer no futuro. O escritor e psicólogo social Jonathan Haidt defende uma infância longe das telas em seu livro “A Geração Ansiosa”, que será publicado em agosto deste ano. A obra demonstrará como a “infância baseada no brincar” foi substituída pela “infância baseada no celular”, que alterou o desenvolvimento social e neurológico dos jovens, e como podemos fazer na prática a reversão deste cenário a fim de evitar danos psicológicos ainda mais profundos, visto que não é apenas o bem-estar das crianças que está em jogo, mas da sociedade.

Este controle depende essencialmente da ajuda dos responsáveis. Isabela atenta que para ajudar nesse processo, os pais devem, por exemplo, evitar mexer no celular ou parar de assistir à televisão enquanto estiver junto da criança. “Isso estimula o gasto de tempo fazendo outras atividades e gera um convívio social com os pais”, complementa a psicóloga.

Luana Souto, mãe de Benício, de 5 anos, relata como foi feita essa educação digital. “Eu e meu marido decidimos limitar o tempo que nosso filho podia gastar mexendo no nosso celular ou vendo desenho na televisão. E mesmo quando ele começa a pedir muito, dependendo de como está nossa rotina, optamos por sugerir a fazer alguma atividade, como jogar futebol, que é uma coisa que o Benício ama fazer com o pai dele. Com isso, o desenho e o celular ficam como uma segunda opção e com o intuito de ser um entretenimento ao invés de uma dependência.”

A campanha “Infância Livre de Telas” traz esse apelo para a sociedade evitar o uso excessivo dessa tecnologia pelas crianças. O trabalho tem como base resultados de pesquisas como a TIC Kids Online Brasil, que tem destacado os efeitos do uso prolongado de telas pelo público infantil. O projeto visa levar essa discussão literalmente para as ruas, por meio de ações em mídia OOH (out of home), mostrando imagens impactantes de crianças “presas” dentro dessa realidade da dependência das telas em locais estratégicos. Além disso, o site da campanha encaminha ao leitor dicas para promover o uso consciente da tecnologia entre as crianças.