A Gen Z não aguenta mais séries longas?
Custo de produção e rotina das pessoas estão entre os motivos da diminuição da duração das séries.
Postado em 30/04/2025

Entre 1980 e 2000 as séries de TV americanas começaram a se popularizar no Brasil. Com a ajuda dos grandes canais de televisão aberta, as obras que eram consumidas majoritariamente por pessoas que tinham TV a cabo se tornaram acessíveis para todas as pessoas. As primeiras séries de grande sucesso a serem transmitidas foram The O.C. e Smallville, obras com longas temporadas e narrativas extensas, que envolviam as pessoas com reviravoltas e subplots.
Atualmente, é possível observar séries de TV sendo reduzidas a poucas temporadas e uma quantidade menor de episódios. Séries de sucesso como Friends contam com longas temporadas, algo raro de acontecer nos dias atuais. Com o avanço da tecnologia, a expectativa era de que esse padrão continuasse e a qualidade das obras aumentasse, ao contrário da realidade atual.
O professor de cinema do Centro Universitário IESB, Paulo Moraes, explica que o custo de produção de episódios aumentou com o passar dos anos. “Os episódios começaram a encarecer muito, então, as produções de séries hoje em dia têm uma relação de produção muito complicada. É muito caro”, detalha. Antigamente, as produções se passavam em um local fixo, com pouca locação, poucos atores e esse padrão se repetia ao longos dos episódios, o que não gerava muito custo.
Por mais que não seja evidente, as séries demandam muitos recursos financeiros e tempo, como a produção de efeitos visuais, edição, locação de cenários, funcionários, elenco e entre outros. Um dos grandes exemplos disso é a série Stranger Things que gastou cerca de 270 milhões de dólares na produção da quarta temporada, sendo aproximadamente 30 milhões de dólares por episódio, já que a série conta com diversos efeitos visuais, elenco caro e um longo tempo de produção.

O tempo de atenção das pessoas afeta nesse fator?
Com o uso de redes sociais e vídeos curtos a todo momento, o cérebro humano se acostuma a consumir conteúdo de uma forma mais rápida. Em uma pesquisa levantada sobre tempo de atenção, a escritora Gloria Mark relatou que a média de atenção das pessoas caiu de dois minutos e meio para 47 segundos de 2003 para 2023. Apesar do dado alarmante, o jornalista de cultura Pedro Ibarra, do Correio Braziliense, explica que isso não influencia diretamente nas produções atuais.
“Na minha opinião, falar que as séries são mais curtas porque o público não consegue prestar atenção é uma conversa para gerar um embate geracional desnecessário e falar que os mais jovens: ‘só conseguem ver vídeos curtos por conta das redes sociais’. O modelo de consumo das séries mudou como um todo e é óbvio que isso iria implicar em alterações em como essas histórias são produzidas”, completa o jornalista.
Pedro Ibarra ainda ressalta que séries de grande impacto na história, mesmo produzidas no início dos anos 2000, também não contavam com grandes temporadas. Obras como The Wire e Sopranos contam com quatro e seis temporadas respectivamente, e nenhuma tem mais de quinze episódios.
As redes sociais atrapalham ou ajudam?

Ao contrário do que muitos acreditam, as redes sociais ajudam no engajamento e conexão com as séries. “Hoje não dá pra perder um episódio de uma série muito popular de lançamento semanal e sair ileso de spoilers no X (antigo Twitter). As redes se tornaram excelentes lugares para teorias e para engajar inclusive com os artistas que participam da produção”, relata Pedro Ibarra.
“Os episódios vem em menos quantidade, mas os conteúdos sobre são muito mais presentes graças as redes sociais. Não se via teorias de Sopranos no Reddit ou edits da Rachel de Friends no TikTok na época do lançamento dessas séries”, completa Pedro Ibarra.
No lançamento de The last of us em 2023, série baseada em um jogo eletrônico da Sony Computer Entertainment, o Brasil liderou o ranking de interações sobre a obra nas redes sociais. A audiência da série na América Latina nas primeiras 24 horas foi a maior de uma estreia da história no serviço de streaming da Max, ultrapassando Euphoria.
Como o público vê essa mudança?
Uma das grandes questões é se esse novo formato afeta ou de alguma forma limita o desenvolvimento das histórias e relação do público com os personagens. Para Caroline Moura, estudante de Jornalismo de 21 anos, em alguns casos as séries antigas acabavam se perdendo ao longo das temporadas devido ao poder do público sobre a narrativa, onde os produtores estendiam o desenvolvimento de certa trama ou personagem para fazer o famoso “fan service”.
“Hoje em dia a popularidade ainda interfere em algumas produções, mas sinto que cada vez mais os criadores estão pensando em séries com um número específico de temporadas desde o início, o que eu acho que forma um resultado mais consistente. Mas em algumas obras acredito que esse novo modelo com temporadas de no máximo 10 episódios pode sim ser limitador”, completa a estudante.
Sophia Santos Ribeiro, estudante de Enfermagem de 20 anos, acredita que séries curtas, em certos casos, acabam sendo prejudicadas ao desenvolver a trama. “Sinto falta do desenvolvimento dos personagens, às vezes”, relata Sophia.
A forma como o público se conecta com as pessoas também pode ser uma questão quando se trata do tamanho das séries. Julia Ribeiro, de 23 anos, sempre preferiu séries maiores e acredita que isso cria uma conexão maior com os personagens, e apesar da qualidade das obras atuais, essa ligação era desenvolvida com maior facilidade ao longo de grandes temporadas.
A escolha entre séries longas ou curtas varia de pessoa para pessoa e da rotina de cada um. Carlos Eduardo Ibarra, de 22 anos, trabalha como repórter e é estudante de comunicação organizacional. Reflexo de um dia a dia corrido, ele diz preferir séries mais curtas. “Minha rotina é muito puxada, então, muitas vezes, prefiro assistir algo mais curto ou que está sendo muito falado a começar uma série mais longa e mais antiga. Acho que se minha rotina fosse mais leve eu assistiria mais séries antigas, que já têm mais temporadas lançadas”, explica Carlos.