Muito além do inglês: estudo de línguas está em alta
Brasília tem até um Clube Poliglota, que promove encontros gratuitos para a prática livre de idiomas
Postado em 22/04/2025
Sara Beatriz é uma jovem universitária de 25 anos que estuda Letras na Universidade de Brasília (UnB). Há, contudo, um diferencial em sua formação: o fato de seu curso ser de Letras em Língua e Literatura Japonesa. “Meu interesse é na área de tradução. Ela [a língua japonesa] me atrai mais [do que outras línguas] pela leitura, escrita e tradução”, explica.
Jovens como Sara procuram cada vez mais aprender e praticar idiomas estrangeiros, ou até mesmo especialização acadêmica. Essa demanda cresce tanto por interesse cultural e linguístico, como também para ampliar as oportunidades de trabalho. Os idiomas mais buscados hoje em dia, segundo cursos de línguas, como o da plataforma Preply, são inglês, liderando a lista, espanhol, francês e línguas asiáticas como mandarim, japonês, coreano e árabe.

Para a graduanda, ela sente que enfim encontrou a área profissional que quer focar. “Eu quero trabalhar com isso. Agora finalmente me encaixo em algo”, desabafa.
Esse também é o caso de Vítor Carvalho, de 25 anos. Vítor é formado em Línguas Estrangeiras Aplicadas pela UnB e, durante a graduação, além de aprimorar seu inglês, teve também contato com espanhol, francês, coreano, japonês e mandarim. Hoje em dia, busca dedicar a maior parte de seus estudos de linguagem para a língua japonesa. “Depois de conseguir um domínio sólido sobre a língua inglesa, a vontade de conseguir me conectar com mais pessoas e entender outras línguas veio de forma natural”, afirma.
Diferente de Sara, se especializar em línguas não era a primeira escolha de Vítor. Contudo, ele conta como foi fácil se acostumar com o ensino superior, onde respirava línguas estrangeiras e, no fim, desenvolveu uma afinidade forte pelo campo. “Estar perto de outras pessoas com o mesmo interesse fortalecia ainda mais o meu amor pelo aprendizado de idiomas”, acrescenta.
O conhecimento da linguagem
“Tem um interesse cada vez maior em aprendizado de língua estrangeira, especificamente o inglês, porque hoje em dia ele é nova língua franca, né?”, conta Luciana Santos, especialista em multilinguismo em línguas estrangeiras pela Universidade de Brasília. Ela conta como o inglês, atualmente, é a língua do comércio, das relações internacionais, da política, da economia, e da ciência.
Luciana associa o aumento dessa busca por aprendizado à comunicação digital. “É muito mais fácil você pesquisar uma forma de falar com outras pessoas ou de interagir com um determinado sistema do que você esperar aquele site ou aquela notícia ser adaptada para sua língua”, explica. A busca por autonomia para navegar na internet e nas redes sociais ajuda a guiar o interesse por línguas estrangeiras, principalmente em jovens, além da própria globalização.
Para a linguista, os estudos linguísticos são capazes de revelar nuances de culturas diversas. Isto é, pequenas diferenças, principalmente lexicais, em palavras que existem em todas as línguas, como “fogo” ou “livro”, demonstram como cada palavra se comporta em linguagens variadas.
A prática de idiomas
No Distrito Federal existe um grupo de pessoas que promovem encontros gratuitos para a prática livre de idiomas, o Clube Poliglota Brasília. Com encontros semanais em pontos específicos do DF, o clube completa 11 anos em maio de 2025, movido pela premissa de unir pessoas com interesses comuns de aprofundar seu conhecimento em línguas estrangeiras.

João, com 36 anos, é anfitrião dos encontros de Águas Claras e faz parte do Clube há oito anos. Para ele, o diferencial desse modelo de prática é a espontaneidade e simplicidade de encontrar e conversar com outras pessoas sem um tema pré-definido. Além disso, “você pode praticar diferentes línguas num só lugar, e se quiser ir e ficar só ouvindo as conversas até se sentir mais confortável para falar, também pode”, explica.
Melissa é uma estudante de Biologia de 23 anos. Ela faz parte do Clube Poliglota há dois anos, também desempenha o papel de host (anfitrião) e estuda inglês, francês e espanhol. Ela leva o aprendizado de idiomas como um hobby, principalmente pelo quesito cultural. Para além disso, porém, ela admite sentir suas possibilidades profissionais se ampliando e já até surgiram algumas oportunidades. Para Melissa, aprender e praticar novos idiomas é uma ótima forma de desenvolver capacidades cognitivas e permite o intercâmbio cultural, o que é uma experiência enriquecedora.
Vinicius Henrique se diferencia dos demais praticantes por estudar alemão e praticar italiano, francês e espanhol e ainda estar no ensino médio. Seus amigos brincam que ele sabe “todos” os idiomas, menos o inglês. “O interesse surgiu quando eu tinha uns 8 anos de idade ao ouvir minha irmã falando inglês. Só que eu nunca aprendi inglês, né? Na verdade, eu me interessei por outros idiomas”, relata.
Ele frequenta o Clube Poliglota há aproximadamente três anos, com algumas pausas. Sua aspiração no momento é se tornar host e está se preparando para assumir a responsabilidade de organização e recepção nos encontros em Samambaia. Para Vinicius, o fato do clube promover interações presenciais e a oportunidade de conhecer e conversar com pessoas novas é tão bom quanto o próprio estudo de línguas. “Em desempenhar outros idiomas, você cria a sua estabilidade social e assim forma um círculo de amizade”, conclui.
Idiomas e trabalho
Além da questão cultural e global, o estudo linguístico apresenta maiores oportunidades no mercado de trabalho, como levantado por muitos dos entrevistados. Para Vítor Carvalho, o conhecimento em idiomas abriu portas em áreas que não seriam acessíveis de outras formas. “Pude conhecer e trabalhar com pessoas que normalmente eu não teria contato, e que expandiram muito a minha visão de mundo”, relata.
João também relata como o domínio de outra língua o permitiu trabalhar como professor por mais de dez anos. Até Vinicius conta como saber espanhol o auxiliou na escola, que é hispano-brasileira, ao conseguir compreender e interagir com professores estrangeiros.
Luciana Santos afirma que o inglês ainda é a língua mais forte em áreas como tecnologia da informação, diplomacia e economia, com muitas empresas exigindo ao menos um conhecimento básico do idioma. Entretanto, é possível ver o crescimento do interesse global em outros idiomas. “Acho que é uma pressão importante que está acontecendo agora, que as pessoas estão buscando mais essas línguas asiáticas, não só por causa de fatores econômicos, mas também por fatores culturais”, afirma.
A popularização da cultura asiática, como K-pop e anime, tem influenciado a busca pelo aprendizado de línguas não-ocidentais. Luciana levanta o ponto de que cada vez mais pessoas estão “procurando aprender a falar coreano, porque querem viajar, ou então aprender japonês porque querem explorar a cultura japonesa, tanto pelo anime como pelo mangá.” Esses fatores trazem mais atenção para o estudo do japonês, do coreano e até mesmo do mandarim, ampliando o campo das línguas estrangeiras no Brasil.
Serviços
Clube Poliglota
Os encontros têm atmosfera descontraída, com separação de línguas por mesa, identificadas por pequenas bandeiras que representam os países dos idiomas praticados. Lá é possível escutar inglês, espanhol, francês, russo, japonês e até mesmo estrangeiros praticando português. O cronograma é fixo: segunda é no JK Shopping, de 19h30 às 21h30; na terça, no Águas Claras Shopping das 19h30 às 22h; quarta, a cada 15 dias, acontece na Asa Norte, no Plaza Norte Shopping, de 19h30 às 23h; quinta, também quinzenal, é na Padaria Pães e Vinhos do Sudoeste, das 19h30 às 22h30; sexta é no Don Durica da Asa Sul, de 19h às 22h30; e, por fim, sábado, em Águas Claras, na Padaria e Confeitaria Potiguar, de 15h às 18h30.
