Literatura LGBTQIA+ combate preconceito e incentiva representatividade

Henkasuru – o amor do outro lado, livro de estreia de Prhyscilla Ferreira, aborda romance entre duas mulheres e levanta bandeira da diversidade

Vitórian Tito

Postado em 06/10/2021

A literatura favorece a formação dos indivíduos e abre portas para novos conhecimentos, olhares e culturas. Permite viagens por diferentes universos, instiga a imaginação, aflora os sentimentos e apresenta as infinitas possibilidades de existir. Para contribuir com esse cenário, a escritora paraense Prhyscilla Ferreira, 29, apostou no romance lésbico com pitadas de feminismo no primeiro livro da carreira para representar um público do qual faz parte e possibilitar que outras mulheres se enxerguem em obras literárias.

Os livros exercem o crucial papel de levar representatividade para que crianças, jovens e adultos se identifiquem e aprendam sobre as realidades plurais da sociedade. Lançado em 2021, a obra “Henkasuru – amor do outro lado”, nasceu do termo que significa o estado de se transformar e conta os desafios e reviravoltas em contexto de choque cultural da sociedade tradicional japonesa para que Maya, uma mulher negra, e Hinata, uma professora japonesa, possam, enfim, se amar. 

Se reconhecer em alguém que está nos holofotes, seja na vida real ou na literatura, é uma forma de inclusão e forte expressão de representatividade, mas isso nem sempre foi assim. A literatura focou, por muito tempo, em roteiros heteronormativos de pessoas brancas, cisgênero e classe média. Fora desse padrão, obras com personagens e relações plurais têm ganhado espaço entre o público e contribuem para adicionar referências e modelos de inspiração para grupos que se viam pouco – ou nada – representados. 

Para Prhyscilla, representatividade é importante porque a arte é uma expressão do cotidiano e pessoas reais desejam se enxergar em manifestações artísticas. “Quando decidi escrever um livro, eu via pouca representatividade em mulheres que amavam outras mulheres. Porém, esse ano tivemos um boom, principalmente de e-books, com muita representatividade de escritores e editoras independentes”, destaca. 

Nesse sentido, os livros provam sua importância com o aumento da atenção e procura dos leitores. De acordo com dados do 7° Painel do Varejo de Livros no Brasil, divulgados pelo Sindicato Nacional de Editores de Livros (Snel), no primeiro semestre de 2021, o setor editorial brasileiro vendeu 28 milhões de livros – um aumento de 48,5% em relação ao mesmo período do ano passado. 

O impacto dessa presença valida e assegura a existência da pluralidade, além de contribuir para a conscientização e respeito ao próximo. Livros que abordam pautas LGBTQIA+ apresentam a literatura como ferramenta fundamental para proporcionar debates, quebrar preconceitos, desmistificar tabus e impulsionar representatividade. 

“Essa geração de agora está muito bem servida de representatividade. Levando em consideração o avanço da tecnologia, hoje você pode ler um livro no celular. Há 10 anos isso não era possível, tinha que comprar um livro físico e a representatividade LGBT era bem escassa, às vezes subentendida. Então a importância da representatividade é de se enxergar como pertencente a uma sociedade que existe”, destaca Prhyscilla. 

A importância de se enxergar

Com a obra de estreia, Prhyscilla Ferreira alcançou, em menos de um mês, o top 15 dos livros mais vendidos na Amazon na categoria romance lésbico. Formada em letras, ela sempre teve o sonho de se tornar uma escritora publicada e conquistou o objetivo em 2021 com a aprovação do primeiro livro pela editora independente Delirium.

“A única coisa que eu desejava era que algumas pessoas se sentissem representadas e se enxergassem no livro, por isso coloquei algumas problemáticas importantes de se debater: violência psicológica, autoaceitação e a questão de você sair um pouco da casinha e da sua zona de conforto”, explica. Como resultado, recebe comentários e avaliações positivas de homens e mulheres que nunca tinham lido obras com a temática de romance lésbico. 

“Eu nunca tinha visto um livro em que uma personagem negra e uma personagem oriental, no caso japonesa, se relacionassem no âmbito LGBT, no amor entre duas mulheres, e sempre achei essa combinação muito significativa. Foi assim que surgiu Henkasuru”, explica. 

A literatura também faz diferença na vida da professora Alba Rocha, 30. “A partir dela eu conheço pontos de vista, lugares e histórias diferentes. Saio do meu mundo mundo para entrar no mundo de outras pessoas, e isso foi e continua sendo muito importante para, inclusive, moldar o meu caráter”, diz. 

Como uma mulher bissexual apaixonada por livros, Alba conta que sentia falta de personagens que a representasse na literatura que acompanhou seu crescimento. Entre os enredos com páginas recheadas de casais heteronormativos, ela não se percebia completamente inserida e isso dificultou o relacionamento pleno com aquelas experiências.  

“Eu não só me sentia excluída como me sentia estranha, meio errada até. Então se eu já tivesse tido contato com histórias, com uma literatura que me representasse, talvez eu não tivesse tido tanta dificuldade em me aceitar”, sugere. Conhecer Henkasuru foi, para ela, uma verdadeira e feliz surpresa. “Eu me senti representada não só pela questão da sexualidade, mas realmente pelas personagens porque me identifiquei com várias características delas”, finaliza. 

Henkasuru está disponível nas plataformas digitais em formato físico ou e-book. Para adquirir, basta acessar a página da editora ou procurar pela obra na Amazon