Compras inconscientes criam relação de vínculo com marcas “emocionais”

Para especialistas, na era digital as pessoas procuram saber mais sobre a compra, mas são vítimas de maiores estímulos estratégicos

Sthefanny Sousa

Postado em 24/05/2022

Na internet, onde existe maior consciência do consumidor, também são executados os maiores gatilhos mentais

De acordo com pesquisa realizada em 2003 pela Universidade de Harvard, 95% das decisões de compra são inconscientes, realizadas por emoções. Para Kátia Souza, 42, doutora em comunicação social pela Universidade de Brasília (UnB), o processo é comum: “A compra inconsciente acontece por sermos seres emocionais e nossa primeira reação a qualquer estímulo é quase sempre a emoção. Isso faz com que um indivíduo supere a racionalidade e, consequentemente, ocorra o surgimento de ações inconscientes como o consumo”

Apesar disso, no ambiente virtual as compras são propensas a serem mais pesquisadas antes do pagamento. “As pessoas pesquisam e leem as avaliações de outros que compraram o produto, porém a grande estratégia [da marca] está nas promoções e cupons que o site disponibiliza ao comprar. O produto pode ser bastante duvidoso, mas só de ter o frete grátis acredito que isso se torne o grande motivo da compra ser efetuada. São muitas estratégias”, explica o psicólogo Caio Sousa, 24.

A fisioterapeuta Evellyne Sousa, 31, admite que o maior impulso na hora da compra são as liquidações. “Acontece muito com produtos de beleza e roupas, principalmente com as combinações feitas nos anúncios”. Ela pesquisa bastante virtualmente e a maior parte de suas compras é feita online.

“Para que uma publicidade se torne atrativa, ela necessita de um planejamento e criatividade para se destacar em meio a uma imensidão de marcas que disputam os mais diferentes mercados”, segundo Kátia. Ainda mais no ambiente virtual, onde a presença e convencimento de um vendedor não acontecem.

Como acontece a inconsciência

As compras inconscientes acontecem quando o cérebro reptiliano, responsável pelos reflexos e impulsos, é atingido diretamente. Essa parte mais antiga do cérebro está ligada aos instintos primitivos, preservação da sobrevivência, centralidade e possui interligações com os sentimentos proporcionados na hora da compra de um produto ou serviço.

Existem diferentes ferramentas que a publicidade pode utilizar para que esse sentimento de “sobrevivência” possa ser despertado. Ações como “última chance”, “oferta por tempo limitado”, “preço imbatível”, são algumas das tentativas que são praticadas pelo mercado. Kátia ressalta que também deve-se avaliar quem recepciona a informação: “A intelectualidade do ator social não pode ser menosprezada, eles sabem julgar o que de fato é senso de urgência e aquilo que realmente são estratégias de venda”.

É importante reconhecer que nem todas as compras inconscientes têm responsabilidade atribuída ao marketing. Fatores culturais, comportamento familiar, desordem psicológica e necessidade de pertencimento são outras ações que podem levar ao consumo. Caio afirma que o que importa para o cliente é a sensação ao final da compra: “A confiança na marca advém da satisfação que você sente após adquirir o produto, que pode ser mais explorado em compras futuras como o Iphone, que a cada lançamento continua tendo aquisições”

No comitê estratégico de marketing que aconteceu em julho de 2014, o especialista Fernando Kimura afirmou que o cérebro humano é egoísta e a palavra “você” seria a chave mestra do ato de venda inconsciente. “Também é importante que o vendedor ou marca crie uma linha de pensamento, que é um estímulo confortável para o cérebro”, compartilha.

“Desde a psicologia das cores até a narração do produto, se tiver, são estudados e aplicados da melhor maneira para que pelo menos o público se lembre do produto futuramente, através de slogans ou logo marca”, diz Caio. Evellyne completa: “Eu mesma quando compro um eletrodoméstico me sinto como nas propagandas sobre ele na TV”.

O gatilho da identificação 

Em diversas plataformas, a identificação busca atingir o cérebro reptiliano na hora da compra

O e-commerce brasileiro registrou um faturamento maior que R$ 161 bilhões em 2021, um recorde de crescimento de 26,9% comparado ao ano anterior. O número de pedidos aumentou em 16,9% com 353 milhões de entregas, segundo dados da Neotrust, empresa responsável pelo monitoramento de mais de 85% do e-commerce brasileiro.

As propagandas, principalmente em datas comemorativas como Dia das Mães, estão criando um vínculo de empatia com o telespectador, através da identificação com a marca. Hashtags como #MaternidadeSemJulgamentos revelam no anúncio mães “reais” que expressam seus problemas de forma aberta, unindo diferentes perspectivas em torno de um ponto em comum: ser mãe.

A humanização de empresas traz, além do aumento de vendas, uma linha de transparência que os clientes desejam. “Estamos em uma nova era, na era dos valores, da informação por multiplataformas, de consumidores cada vez mais conhecedores, informados, que cobram da empresa um posicionamento e que ‘levantem a bandeira’ de uma causa para continuar no mercado”, pontua Kátia.

A empatia com pessoas “gente como a gente” também conquista as redes sociais. Digitais influencers que compartilham seu dia, valores e se mostram mais “humanos” conquistam mais seguidores em suas contas pessoais. Evellyne afirma que não é influenciada por grandes famosos da internet, mas escuta pessoas que não são conhecidas: “Levo em consideração que eles [digitais influencers] estão recebendo sem muitas vezes conhecerem o produto, mas dicas de usuários não famosos me influenciam, em maior parte, por achar que o feedback é mais real”.

Porém, Caio ressalta que, apesar de natural, as pessoas devem reavaliar suas compras para saber se não estão sendo vítimas de um consumismo inconsciente e desenfreado. “Analisando o histórico de compras e comparando qual foi o gatilho comercial que motivou a aquisição dá para traçar uma linha de estratégias que te convencem a comprar”, orienta.