Um ensino médio que gera muitas dúvidas

O novo modelo, que começou a valer este ano, tem causado discussões sobre sua aplicação e gera dúvidas sobre os reflexos nas próximas gerações

Thalya Cunha

Postado em 21/04/2022

Neste ano de 2022, começou a vigorar nas escolas públicas e particulares do Brasil, o novo modelo do ensino médio proposto pelo Ministério da Educação (MEC) durante o governo Michel Temer, em 2017. O projeto tinha como objetivo inicial a melhora da qualidade do ensino, tornando-o mais atrativo aos alunos.

De acordo com a legislação que regulamenta o sistema de ensino, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), as escolas devem orientar os alunos no processo de escolha das áreas de conhecimento ou de atuação profissional (Artigo 35, parágrafo 12, LDB).

A partir de agora, o conjunto de aprendizagem, que antes era composto por 12 disciplinas, se estruturará em quatro áreas do conhecimento, sendo: Matemática, Linguagens, Ciências Humanas e Ciências da Natureza. Além disso, há formação técnica e profissional, e itinerários formativos que orientam o aluno, como o Projeto de Vida.

Outra mudança é a carga horária mínima, que passa de 2.400 horas durante o triênio, sendo 800 horas anuais, para 1.000 anuais, portanto, 3.000 horas durante todo o ensino médio.

A escolha profissional amedronta os alunos. | Reprodução: Banco de imagens Pexels

No papel funciona. E na prática?

O novo ensino médio é resultado de uma revisão do modelo antigo que tivemos por vários anos. Apesar de ser uma proposta incentivadora, o novo modelo tem causado uma interpretação limitada por parte da sociedade sobre as possibilidades de ensino. “A proposta é boa, mas a aplicação que as escolas fazem é problemática”, explica Ana Bárbara Nascimento, doutora em educação e professora de sociologia e filosofia em Brasília.

Todas as matérias são importantes para a construção do conhecimento e nenhuma disciplina deve ser diminuída por qualquer motivo que seja. “Um aluno que deseje cursar medicina não pode focar somente nas disciplinas da natureza. Ele precisa saber também sobre sociologia porque na faculdade ele terá ética e bioética, para poder ir trabalhar nas comunidades ribeirinhas é preciso ter um entendimento social”, exemplifica a professora de sociologia. Para Maria Virgínia Silva, estudante do 1º ano do ensino médio, “é imprescindível ter acesso a todas as matérias. Assim, mais pessoas têm acesso à educação de qualidade”.

Os alunos estão preparados para essa escolha?

Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), cerca de 56% dos estudantes abandonaram ou trocaram a graduação por diversos motivos, como dificuldades financeiras, mudança de turno, falta de identificação com o curso. Um exemplo disso é Maria Clara Alves, 20 anos, que abandonou a graduação em Turismo, para cursar Design numa instituição privada. Ela afirma ter escolhido o curso por impulso.

A taxa de evasão no ensino superior também é um problema. Reprodução: Agência Brasil

Para Ana Bárbara, os alunos tendem a fazer escolhas impulsivas por cursos que estão em alta ou por imposição familiar, então a evasão nas faculdades, principalmente públicas, é grande. Além da evasão, que gera de certa maneira um atraso na vida do estudante, há um prejuízo aos cofres públicos, que deixam de ter no futuro uma mão de obra qualificada.

Juliana Mendes, estudante do 1º ano, diz que tem uma ideia do que cursar, mas não é nada concreto e tem receio de errar quando for a hora de escolher. “Tenho medo de escolher algo que não me identifique e perder tempo”, pondera a estudante.

Para a especialista em educação, Ana Bárbara, esse novo modelo de ensino médio, que forma mais técnicos do que pensadores, interessa aos políticos, que esperam uma massa menos instruída. Isso traz à tona, novamente, o princípio de ingresso nas faculdades, como um lugar elitista, de poucos e para poucos. “Uma proposta mal aplicada pela sociedade, que forma mão de obra qualificada para a base e não para o pensar. Logo, uma sociedade maior de trabalhadores do que pensadores”, finaliza a especialista.