De Brasília aos principais festivais de música do Brasil: conheça a ilustradora Isabelle Nogueira Marcondes

A artista é uma das mentes criativas por trás do visual do Lollapalooza Brasil, Rock in Rio e The Town

Julia Torrecillas

Postado em 23/04/2024

Com uma trajetória marcada por criatividade e dedicação, a ilustradora e designer brasiliense Isabelle Nogueira Marcondes é uma das mentes criativas por trás do visual de alguns dos maiores festivais de música do Brasil aos 27 anos de idade. 

Isa está inserida nesse universo desde 2021, quando começou a trabalhar no Rock in Rio. Em 2023, testemunhou de perto a expansão do evento para São Paulo, sob o título de The Town. Sua participação a preparou para novos desafios que estavam por vir, e no mesmo ano, a ilustradora viu sua carreira decolar cada vez mais. Decidiu então se mudar para a capital paulista para viver uma das aventuras mais significantes de sua vida.

Após a Rock World – empresa que organiza o Rock in Rio e The Town – assumir pela primeira vez as operações do Lollapalooza na edição de 2024, Isabelle estreou no clássico paulista e realizou um sonho. Passado o evento, ela compartilhou em suas redes sociais sobre a emoção que sentiu ao ver suas artes estampadas em todo lugar que olhava: nas paredes dos festivais, nos palcos, nas pessoas, na loja de produtos oficiais… em todo lugar.

Confira a entrevista completa com a artista:

Fazer parte de festivais como o Lollapalooza Brasil, Rock in Rio e The Town é uma conquista impressionante. Qual trabalho você desenvolve lá dentro?

O trabalho que desenvolvo é bem amplo. Eu sou ilustradora, faço muito desenvolvimento gráfico. Então, todas as artes impressas, lonas, camisetas, copos, estruturas oficiais, stickers que vão para as redes sociais, basicamente tudo que tem desenho no evento tem a minha participação. É uma criação que vai desde os produtos visuais até as dinâmicas internas dos festivais, como as campanhas, a cenografia, sinalização, e muito mais. É um trabalho de idealizar e materializar a integração de tudo isso em uma mesma unidade estética que faça sentido.

Como é a rotina de trabalho de quem trabalha em um festival?

Para começar, é um trabalho colaborativo feito junto a um time inteiro de pessoas super talentosas e incríveis. Sempre sentamos juntos e discutimos as ideias, cada um com sua especialidade para ajudar no que precisa, e nós participamos de todas as etapas do projeto, justamente para chegar no melhor resultado possível. Todos os departamentos do festival se unem para trocar referências e criar em conjunto.

A primeira fase é a de concept, com essas trocas de ideias em um grande brainstorm. Depois, passamos para a fase de sketch e de experimentação, juntando fotos como referência, e às vezes até jogamos na inteligência artificial para conseguir visualizar antes de começar a executar de fato as coisas. Passamos por muitas aprovações em diversos departamentos, e somente quando tudo é aprovado, partimos para a execução, que é a parte final.  Além de idealizar e criar, também somos responsáveis por mandar os produtos finais para os fornecedores produzirem. Por isso, temos que estar sempre atentos aos prazos e nos organizar para que tudo seja executado em tempo hábil.

Uma coisa que faz toda a diferença nesse processo é que temos que estar sempre consumindo e se atualizando, então acaba que conversamos muito um com o outro sobre música, filmes, artistas, livros, o que é bem bacana porque acaba aumentando nosso repertório. No nosso departamento não existe ideia ruim, as pessoas têm compreensão de que tudo é possível, e que tudo pode ser uma saída interessante.

Cada festival tem sua proposta visual, voltada a públicos diferentes. Como fazer para conciliar as diferentes demandas de cada evento?

Essa questão é um pouco complexa, afinal, estamos lidando com uma sobreposição de eventos, linguagens e públicos que, às vezes, pode causar um emaranhado de ideias na mente. Isso exige uma habilidade especial de foco, é como se eu tivesse que ficar abrindo e fechando várias caixinhas diferentes no cérebro. O maior desafio ao lidar com vários festivais simultaneamente é entender as prioridades de cada um.

Eu sou o que muitos consideram como “ilustradora generalista”, ou seja, alguém que não se prende a um estilo específico. Adoro explorar e estudar vários estilos, compreender a lógica por trás deles e depois reproduzi-los. Isso me permite estar envolvida em diversos projetos simultaneamente, mas claro, sempre com meu toque pessoal. É gratificante ver o projeto concluído e pensar: “Uau, consegui dominar tal estilo, tal técnica, uma nova forma de expressão, essa linguagem.” 

Qual a importância da arte e das ilustrações em festivais de música?

A parte visual de um festival faz toda a diferença na experiência do público. Queremos proporcionar um momento único e indescritível para quem está presente, fazendo com que se sinta imerso em um ambiente efêmero, um espaço que transcende o cotidiano. O local do evento se transforma em parte da experiência. É como se quiséssemos que a pessoa esquecesse de tudo ao entrar no festival: seus problemas, o trabalho, o mundo lá fora. Queremos que elas estejam de corpo e alma em um universo mágico, e não vejam apenas um palco ou uma tenda, mas que reconheçam as marcas, vivenciem as experiências. A composição de um festival envolve diversos elementos – músicos, palcos, artes, público – e quando todos esses elementos se integram, criamos um universo coeso que chega a influenciar até mesmo a energia do público.

Por isso, cada detalhe importa. Desde o tamanho da fonte nos letreiros até a posição das placas de sinalização, tudo é pensado para garantir uma experiência envolvente. As artes, para além de decorativas, têm que ser funcionais e seguir o restante do padrão estético do evento. Caso contrário pode ter uma quebra do ritmo, uma quebra do design, e consequentemente uma quebra da experiência “de outro mundo”. Os produtos oficiais também são uma forma de transformar o espaço em memória. Cada foto tirada, cada lambe colado, cada mural torna-se parte da experiência, permitindo que as pessoas revivam aqueles momentos especiais sempre que olharem uma foto, por exemplo.

Fotos: Arquivo Pessoal/Isabelle Nogueira

Agora sobre o resultado final: Qual a sensação que fica quando você vai aos festivais enquanto a artista que ajudou a dar vida a parte visual do evento? Como é poder ver o seu trabalho tão amplamente reconhecido e apreciado?

É muito emocionante. A primeira vez que eu vi as pessoas usando produtos que eu fiz, seja nas roupas ou apenas segurando um copo, eu arrepiei todinha e meu olho encheu d’água. É como se estivesse me comunicando com cada uma delas, e ver elas se sentindo representadas nas minhas criações é surreal, fico muito emocionada. 

Uma coisa engraçada que eu adoro fazer é sair circulando no festival ouvindo a conversa da galera, sempre tem um sidetalk que o pessoal faz entre si, uma crítica, um elogio. Isso aconteceu muito isso no Lolla, as pessoas vendo os lambes e se cutucando, rindo, falando “Nossa, olha aquele ali que legal!”, ou  então falando “Nada a ver esse aqui, que feio!”. A mesma coisa acontece na LPO (lojas de produtos oficiais). Eu gosto dessa honestidade, e inclusive acho que faz toda a diferença para entender o público. Eu escuto cada pérola que acho que a maioria dos artistas ficaria meio ofendida, mas acho muito divertido e de certa forma ajuda a melhorar o meu trabalho, sabe? 

Eu estou muito feliz com a confiança e com a oportunidade que me deram. De fato, é um sonho. Eu sempre gostei muito de música, e o Lollapalooza foi o primeiro festival que fui. Lembro de olhar para aquilo e pensar “Meu Deus, que coisa surreal!”. E aí, oito anos depois, estou fazendo parte de uma edição e colocando o meu traço nele. Ver as coisas prontas, as pessoas comprando a ideia, grandes artistas nacionais e internacionais postando fotos com o meu trabalho faz tudo valer a pena. Eu ralei muito para estar onde eu estou.

Além disso, eu gosto muito do processo. O resultado me deixa feliz e orgulhosa comigo mesma. Às vezes eu tô de boa, ligo a TV e aparece no Jornal Nacional um trabalho que eu fiz. Ou então, estou andando na rua e vejo alguém com uma camiseta que fizemos. O sentimento que fica é de realização. Quando eu tinha 16 anos, o que eu gostava de fazer para me divertir era literalmente o que eu faço hoje como profissional. Botava uma música no fone de ouvido e ficava desenhando, vendo referências de arte, fotos, filmes, livros. Tem horas que eu paro para lembrar e fico “Caramba Isa, você conseguiu, olha só onde você tá!”. É muito importante celebrar suas conquistas, mas também é fundamental reconhecer  todo o esforço e planejamento. É muito bom você se sentir no lugar certo.