Fibromialgia desafia a sociedade com sintomas persistentes e diagnósticos lentos
Mesmo afetando milhões de pessoas no Brasil e no mundo, a síndrome segue cercada por preconceitos, diagnósticos tardios e falta de políticas públicas específicas; especialistas e pacientes alertam para a importância de visibilidade, tratamento adequado e acolhimento.
Postado em 16/05/2025

Comemorado no dia 12 de maio, o Dia Mundial da Fibromialgia chama atenção para os obstáculos enfrentados por milhões de pessoas em todo o mundo que convivem com essa condição debilitante. Estima-se que cerca de 150 milhões de pessoas sofram de fibromialgia globalmente, número reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Caracterizada por dores musculares difusas, fadiga intensa e distúrbios do sono, a fibromialgia é uma síndrome clínica complexa, de causa ainda não totalmente compreendida. Apesar da alta prevalência, a doença permanece envolta em estigmas e desinformação, o que dificulta o diagnóstico precoce e o acesso a um tratamento eficaz.
A fibromialgia é uma síndrome clínica que afeta o sistema musculoesquelético, provocando dor crônica difusa sem causa inflamatória aparente. Além das dores, os pacientes costumam relatar sintomas como fadiga, alterações cognitivas, sono não reparador, ansiedade e depressão. De acordo com a Sociedade Brasileira de Reumatologia, a condição atinge principalmente mulheres, entre 70% e 90% dos casos, podendo ocorrer em qualquer faixa etária.
A reumatologia é a especialidade indicada para avaliação da síndrome. Segundo o reumatologista Roberto Carlos Mariz, o diagnóstico envolve a exclusão de outras doenças: “A fibromialgia é uma síndrome complexa cuja principal característica é a dor crônica generalizada, embora não seja o único sintoma. A doença pode simular outros quadros clínicos, tornando essencial a realização de exames para descartar causas secundárias. Por isso, o acompanhamento é indispensável.”
O especialista destaca que o início da doença pode estar associado a eventos traumáticos, físicos ou emocionais e que, apesar de não haver inflamações ou lesões aparentes, a dor é real e tem comprovação em exames de imagem cerebral.
Vivência e desafios no diagnóstico
Lúcia Oliveira, de 55 anos, moradora de Santa Maria, convive com a fibromialgia há mais de duas décadas. O diagnóstico foi confirmado após anos de consultas com diferentes especialistas. Para ela, o processo de aceitação foi essencial no controle das crises: “A dor é tão intensa que me sinto completamente neutralizada. Já usei analgésicos fortes, fiz hidroginástica, mas a água fria piorava os sintomas. Sinto muito preconceito, principalmente por ser uma doença invisível.”

Lúcia destaca que o estigma e a falta de compreensão sobre a síndrome são obstáculos adicionais ao tratamento. Ela relata que prefere manter as crises em silêncio, para evitar julgamentos e desconfiança por parte de familiares e colegas.
O diagnóstico da fibromialgia é exclusivamente clínico, baseado em critérios como a presença de dor difusa por pelo menos três meses e sensibilidade em pontos específicos do corpo. Não há exames laboratoriais específicos que confirmem a síndrome, o que frequentemente leva a atrasos no diagnóstico e tratamentos inadequados.
Pacientes relatam passar por diversos especialistas antes de chegar a um reumatologista. A ausência de marcadores objetivos nos exames comuns, muitas vezes, leva ao questionamento da legitimidade da dor relatada, aumentando o estigma em torno da condição.
Heliane Rocha, de 50 anos, moradora de Goiânia, conta que a estrutura da clínica que frequenta contribui positivamente para o tratamento. “Como meu médico é especialista em reumatologia, além de fibromialgia, ele atende uma grande variedade de pacientes, inclusive de outras cidades fora de Goiânia. Conversando com outros pacientes, percebo que muitos chegam por indicação, o que reforça a confiança no trabalho dele”.
Tratamento e manejo dos sintomas

O tratamento da fibromialgia é multidisciplinar e individualizado; inclui:
- Medicação (como antidepressivos e analgésicos);
- Psicoterapia, especialmente terapia cognitivo-comportamental;
- Atividade física regular, com enfoque gradual.
O doutor Mariz explica que, embora os exercícios possam causar desconforto inicial, são fundamentais para o controle da dor: “A recomendação é começar com atividades leves, respeitando os limites do paciente. Com o tempo e a adaptação, a dor tende a diminuir, o que permite a introdução de novas estratégias.”
Políticas Públicas
Embora a fibromialgia esteja incluída nas diretrizes do SUS, muitos pacientes enfrentam dificuldades para obter atendimento especializado e acesso a tratamentos integrados. Na rede privada, o acompanhamento tende a ser mais ágil, mas também depende da cobertura dos planos de saúde e da disponibilidade de especialistas.
Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 598/2023, de autoria do deputado José Guimarães (PT-CE), que propõe o reconhecimento da fibromialgia como deficiência para todos os efeitos legais. O projeto prevê ainda o fornecimento gratuito de medicamentos pelo SUS.
O texto está em análise nas comissões da Câmara e, se aprovado, seguirá para o Senado. Em algumas regiões, como o Distrito Federal, já existem legislações locais que reconhecem os direitos de pessoas com a condição.
Pessoas com fibromialgia podem ter direito a benefícios previdenciários, como:
- Auxílio-doença, para casos de incapacidade temporária para o trabalho;
- Aposentadoria por invalidez, quando a incapacidade é permanente;
- BPC/LOAS, benefício assistencial destinado a pessoas com deficiência e baixa renda.
A concessão desses benefícios depende de avaliação médica e do cumprimento de requisitos legais, como tempo mínimo de contribuição ao INSS e comprovação da incapacidade funcional.